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Expansão das universidades federais coloca novos desafios para o seu funcionamento democrático, incluindo a questão central da paridade Mayara Toni Nos últimos anos, o sistema federal de educação superior passou por um intenso processo de expansão, promovido pelo governo federal e incentivado pela sociedade em geral. Novas universidades federais, novos campi, novos cursos de graduação, pós-graduação e extensão estão sendo oferecidos, ampliando o acesso à educação pública de qualidade, embora ainda aquém das necessidades do país. Esse crescimento trouxe consigo também o aumento do número de profissionais que pudessem suprir a demanda inevitável. Mais do que nunca, o novo quadro coloca em pauta a questão da democracia no âmbito da universidade pública. Como enfrentar os inúmeros problemas provocados por uma crônica falta de recursos? Como integrar milhares de novos professores e alunos à vida universitária, preservando a autonomia da instituição, a liberdade de cátedra e a qualidade do ensino? Como assegurar um processo de interlocução transparente e produtivo com a sociedade? Todas essas questões, e muitas outras que poderiam ser agregadas, remetem ao processo decisório no âmbito das universidades, reintroduzindo com força o debate sobre a paridade, tema recorrente na luta pelo ensino público, gratuito e de qualidade no Brasil. A ideia da paridade consiste em um processo de eleição nas universidades que garantem aos três segmentos, estudantes, professores e técnicos administrativos, o direito ao voto com igual peso. Os desafios postos pelo processo de expansão são sentidos de forma particularmente intensa pela Unifesp, dadas as características específicas da universidade: em menos de uma década, o número de estudantes na graduação foi multiplicado por oito em apenas seis anos – de 1.200 para quase 10 mil. Cerca de 1.400 docentes atuam em diferentes áreas, nos seis campi situados na Grande São Paulo, na Baixada Santista e em São José dos Campos. Por outro lado, houve pouco aumento no número de técnicos administrativos. Como resultado, a estrutura ficou deficiente. Como tentativa de criar um quadro de reflexão capaz de apontar perspectivas, não apenas para o seu próprio futuro, mas para as universidades públicas federais em geral, a Reitoria da Unifesp propôs a realização de um Fórum em Defesa da Educação Pública, em 10 de abril, com um debate realizado no anfiteatro central da Unifesp, e outros organizados em todos os campi. Procurou-se, com isso, estimular a participação da comunidade acadêmica, tanto no processo de reflexão quanto na elaboração de uma prática capaz de assegurar a democracia na instituição. Na ocasião, foi aprovado um manifesto que vincula o processo de democratização à adoção de políticas públicas capazes de estender o ensino público superior ao conjunto dos jovens e trabalhadores brasileiros: “Os desafios da democratização do acesso à educação superior de qualidade ainda estão longe de serem vencidos. Uma das metas do atual Plano Nacional de Educação é a de elevar a taxa de matrícula para 33% da população de 18 a 24 anos e assegurar a qualidade da oferta e expansão para, pelo menos, 40% das novas matrículas, no segmento público. Para além da expansão quantitativa, é fundamental a defesa da qualidade do ensino superior, assim como a garantia de recursos adicionais de custeio proporcionais à expansão já alcançada, ampliando ações afirmativas e de assistência estudantil”. O fórum previa a criação de um processo de interlocução permanente junto à comunidade universitária, parlamentares, intelectuais, entidades representativas e organizações sociais afins, em defesa do orçamento da educação e do financiamento que garanta o crescimento e consolidação da educação pública e de qualidade. “É fundamental que tenhamos uma política econômica que permita os diretos da Educação. Esse é o início de um movimento com o qual acreditamos conquistar a adesão por parte de reitores, entidades, organizações e a sociedade. Temos esperança que o novo ministro da Educação e a presidente Dilma tenham a sensibilidade da educação como direito e estamos aqui para ajudar e apresentar as nossas capacidades para a pátria educadora”, afirmou a reitora Soraya Smaili. Encontros Como desdobramento desse processo, a Reitoria organizou audiências públicas concentradas no debate sobre experiências de democratização nas universidades, incluindo a questão da paridade, reivindicação constante dos servidores públicos e da comunidade acadêmica. Em agosto, participaram a reitora Soraya Smaili, o reitor da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), Roberto Leher, o vice-reitor da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), Álvaro Penteado Costa e o assessor da Reitoria da Universidade Federal de São Carlos (UFSCar), Marco Antonio Zabotto. A audiência foi aberta pela apresentação dos sistemas de participação da comunidade nas universidades, dando a palavra aos representantes componentes da mesa. A Unifesp procurou trazer para o debate experiências diferentes das que a instituição vive atualmente, com a finalidade de agregar conhecimento para os presentes. “Nós buscamos trazer experiências que já são de longa data como a federal do Rio de Janeiro, a federal de São Carlos e também a Unicamp”, explicou Soraya Smaili. Diante das experiências apresentadas, o debate foi aberto para a comunidade apresentar suas questões sobre o assunto. Entre reivindicações e dúvidas, o assunto sobre paridade prevaleceu. As perguntas foram pontualmente respondidas pelos presentes. “O tema da paridade faz parte dessa experiência de democracia nas nossas universidades”, apontou Soraya. Em setembro, dando continuidade à ação, estiveram presentes na universidade o Prof. Dr. André Rubião Resende, representante da Unifenas e Faculdades Milton Campos (MG) e autor do livro História da Universidade: Genealogia do Modelo Participativo, o presidente da Associação dos Docentes da Unifesp (Adunifesp), Prof. Dr. Rodrigo Medina Zagni e o Prof. Dr. Félix Ruiz Sanchez, representando a Reitoria da Unifesp. Na ocasião, os presentes foram contemplados com palestras e discussões presentes no livro citado, no qual Rubião conta como os modelos históricos de gestão das universidades pelo mundo influenciam as decisões modernas, além de demonstrar formas de praticar as questões de paridade e democratização com base nesses estudos.   Sumário do número 12
Mariane Tescaro e Daniel Patini O movimento grevista nacional de trabalhadores técnico-administrativos em educação foi encerrado com a saída unificada dos trabalhadores no dia 08 de outubro. Segundo a Federação de Sindicatos de Trabalhadores Técnico-Administrativos em Instituições de Ensino Superior Públicas do Brasil (Fasubra), foram 133 dias de paralisação, 65 instituições federais de ensino participantes e a adesão da maioria dos trabalhadores. A Unifesp incorporou-se ao movimento desde o início, a começar pelo Campus São Paulo e Hospital São Paulo, Reitoria e depois a adesão de todos os campi (Baixada Santista, Diadema, Guarulhos, Osasco e São José dos Campos). O Entrementes esteve na antiga sede do Sindicato dos Trabalhadores da Unifesp (Sintunifesp) para ouvir os representantes, José Ivaldo da Rocha, coordenador geral, e Maria do Socorro Limeira da Silva, membro do Comando Local de Greve, para saber os desfechos e a avaliação da greve, considerada uma das mais longas, segundo a Fasubra. Rocha, mais conhecido entre os seus pares como Zezinho, enumerou algumas das principais e importantes reivindicações do eixo nacional: reposição de 27,3% das perdas salariais do período de 2012 a 2015, aumento do step para 5% (diferença entre um nível e outro na tabela salarial); dissídio coletivo para 1º de maio; luta contra a Empresa Brasileira de Serviços Hospitalares (EBSERH); reenquadramento dos aposentados na carreira; fim das terceirizações e abertura de concursos públicos; diminuição nos impactos do ajuste fiscal proposto pelo governo. Diante desse cenário, alguns assuntos tiveram bom êxito, como: o índice de reajuste referente a reposição das perdas salariais para agosto de 2016, que será de 5,5%, e janeiro de 2017, de 5%; inclusão de 0,1% de reajuste no step. Já os benefícios serão reajustados a partir de janeiro de 2016, nos seguintes índices: auxílio saúde, 22,8% (diferenciado por idade e faixa salarial); auxílio pré-escolar hoje com valores variáveis, de 66 a 95 reais, passa para R$ 321,00; e o auxílio alimentação sobe de R$ 373,00 para R$ 458,00. Na Unifesp Foi criado durante a paralisação um comando unificado de greve abrangendo todos os campi da universidade. Dessa forma foi possível estabelecer o eixo de reivindicações para a Reitoria. “O movimento gerou um relacionamento histórico muito importante, pois houve o envolvimento e consonância dos técnicos administrativos de todas as unidades”, explica Maria do Socorro. Zezinho avalia o desfecho da greve como bom, somando aos resultados obtidos. “Nós temos uma perspectiva muito positiva. Essa greve é consequência de um trabalho de reorganização da nossa categoria, da recuperação da nossa entidade sindical em termos de atuação, de prática política e posições”, comemora. O coordenador geral do Sintunifesp considera ainda os ganhos da Unifesp até maiores dos que as conquistas de nível nacional. “Consideramos uma greve vitoriosa também pelo resultado material, teórico e intelectual, de perspectivas futuras, principalmente com relação à carreira da categoria. Foi uma semente de fortalecimento da nossa organização como representação de classistas e a experiência de realizarmos uma paralisação com uma gestão oriunda de um movimento político e sindical da nossa universidade”. Em meio a tantas solicitações, os representantes chamaram a atenção do tema paridade, que é assunto do eixo nacional e tem reflexos na Unifesp. “A gente entende aqui na universidade como uma questão crucial e reivindicamos o seu encaminhamento”. Os técnicos administrativos em educação (TAEs)retornaram ao trabalho no início de outubro, porém os trabalhadores do Campus São Paulo/ Hospital São Paulo, predominantemente da enfermagem, decidiram continuar com o movimento a fim de obter a jornada de trabalho de 30 horas para todos, que resultou em uma flexibilização para 942 servidores daquela área com carga horária de 30 horas e 33 minutos semanais, após a publicação de uma portaria no dia 23 de outubro [mais detalhes na matéria abaixo]. O Sintunifesp conta hoje com aproximadamente 2.300 associados e com uma sede própria, localizada à Rua Pedro de Toledo, nº 386, Vila Clementino   Sumário do número 12
Por um instante me questionei se no título dessa carta colocaria antes o termo “negra” ou o termo “estudante”, mas logo pensei, “que tolice a minha!”, pois antes de ter o meu diploma, antes de estar na universidade, eu sou negra; antes de abrir a boca para fazer qualquer afirmação sobre quem ou o que sou, é uma negra que veem; quando passo por humilhações como ser perseguida por um segurança em um shopping ou museu, quando me olham exalando nojo, me fazem os mais baixos julgamentos, quando me interesso por um garoto de uma etnia qualquer e penso que há a possibilidade de ser rejeitada por ele ou sua família, não é por ser estudante, mas por ser negra. Ora, o estudo implica diretamente as possibilidades de se conseguir um bom emprego, mas vejam, para muitas empresas, ser negro também se faz um fator determinante, não para que seja contratado, mas para imediata exclusão. Poderia dizer que sou apenas mais uma garota negra estudante universitária, mas geraria a falsa impressão de que somos muitas, quando na verdade somos uma mísera porcentagem da população negra que pode se dar ao luxo das vivências acadêmicas. Sempre me perguntei o motivo de, para tanta gente, minha cor fazer tanta diferença. Até hoje não consegui encontrar uma resposta racional e bem fundamentada. Seria possível, nessa carta, tentar explicar tais atos pela psicanálise, pela psicologia sócio-histórica ou pelo mais puro marxismo, mas optei apenas por apelar ao respeito à dignidade humana, que tanto se admira em teoria, mas tão pouco se vê na prática. Não tente determinar o meu lugar, não tente negar o lugar que escolhi como meu, porque ainda que caia e assim permaneça por um tempo, eu vou me levantar e encontrarei outra forma para buscar o que é meu por direito. Canso de ouvir discursos apelando ao esforço individual, afirmando que “se um é capaz, por que os demais não o são?”. Nessa hora respiro fundo e penso se de fato se trata de uma cegueira política crônica ou simples falta de interesse em tentar compreender que as pessoas são diferentes em suas experiências, contexto histórico, cultural, familiar, social e oportunidades. Quem dera todos pudessem encontrar as mesmas oportunidades no caminho e quanto eu lamento por tantos estarem tão absortos nas ideologias que os inferiorizam, que não sejam nem ao menos capazes de enxergar uma oportunidade. Me questionei durante a escrita se assinaria a carta, pois para alguns, saber sobre o autor é importante, mas para outros uma negrinha nada mais é que uma negrinha e por tratar-se de uma negrinha, pouco importa quem escreveu - leia negrinha como bicha, traveco, judeuzinho, gordo nojento, tribufu, puta, favelado, mongoloide, cabeça chata, aidético, enfim, conforme mandar o gosto do leitor. Ser negra, mulher, pobre, à margem dos padrões de beleza, me faz estar na base da pirâmide social. Isso poderia me fazer chorar, e de fato já me fez por muitas vezes e me fez sofrer a um ponto que não sou capaz de expressar, mas minhas lágrimas já se secaram, às vezes algumas ainda teimam em cair, às vezes ainda tenho vontade de viver em um mundo paralelo onde fenótipo ou características inofensivas das pessoas não se façam motivo para que sejam odiadas (características que em sua essência não são, mas que pela intolerância se configuram como motivo para sofrimento). Não me vejam como uma histérica melodramática que faz apelos aos vossos corações, me coloco como como qualquer pessoa que exige ser respeitada e questiona a intolerância, seja em sua forma mais branda ou brutal. Não tento justificar o opressor, olho pela condição do oprimido; acho fácil falar em vitimização quando não se é o alvo, só quem sente na pele a dor do racismo, da homofobia ou de qualquer opressão é que sabe o que sente. As pessoas trazem marcas diferentes em sua história, são sensíveis para coisas diferentes, em níveis diferentes, portanto não é você ou eu quem deve determinar o quanto uma pessoa deve sofrer por uma determinada situação. Se você vê isso como vitimização, eu te vejo como indiferente, como carente de empatia; é a mesma cena vista por olhares diferentes. Felizmente eu pude aprender a quando olhar determinada situação, contextualizá-la socio-historicamente, não mais vê-la de forma isolada e mais que isso, tentar sempre me colocar no lugar do outro (independente de poder um dia vir ou não a passar por tal situação). Me canso de ver a sutil e dissimulada reafirmação de lugares e papeis sociais (mesmo que o sujeito que lidere essa ação não o faça de forma consciente). Sei que ninguém está livre de agir de forma preconceituosa, e não isento a mim mesma dessa possibilidade. A diferença está no fato de se acomodar a isso ou de por meio de um exercício diário confrontar esses conceitos pré-estabelecidos. Ser preconceituoso não é exclusividade aos discípulos de Hitler, mas pode permear o cotidiano de uma pessoa qualquer; enquanto não se for capaz de admitir tais sentimentos em si próprio, mesmo que doa, nunca se poderá mudá-los. Em uma sociedade em que se nega enxergar as imensas desigualdades, desejar equidade é “pedir para sofrer”. Penso que esse comportamento/sentimento que se chama de vitimização possa ser sucintamente explicado pelo provérbio popular “gato escaldado tem medo água fria!”. De fato atitudes agressivas não me agradam, mas percebo que quando as pessoas têm seus direitos frequentemente negados, quando suas necessidades são tratadas como menos dignas, como questões secundárias, tendem a cair em insensatez. É comum ainda, quando me deparo com esses enfrentamentos, que eu me chateie e me feche, mas há quem coloque pra fora sua agressividade na tentativa de preservar seus direitos, sua dignidade e isso eu não vejo como vitimização, muito pelo contrário, vejo como coragem e disposição pra luta! Peço licença e escrevo essa carta em nome de toda a escória social que polui as ruas em que caminha a classe média brasileira. Atenciosamente, Negrinha   Sumário do número 12
Em todos os campi, os comandos e coletivos locais de mobilização, eleitos pelos técnicos administrativos, levantaram reivindicações referentes aos principais problemas encontrados no dia a dia da universidade. As pautas orientaram a ação da Reitoria no sentido da tentar encontrar a resolução dos problemas. Listamos, em seguida, as principais demandas e as respostas dadas pela gestão, segundo os relatos oferecidos pelos próprios comandos e coletivos. Campus Baixada Santista Demandas: Insuficiência do quadro de servidores técnicos; o setor de infraestrutura carece de recursos que garantam o funcionamento regular mínimo para cumprimento adequado de suas atividades; aumento da velocidade de conexão da internet (uma vez que o campus tem a pior conexão em relação aos demais); a necessidade de uma política institucional mais eficiente e transparente, contra o assédio moral também por diversos setores do campus; ampliação da negociação e flexibilização das regras que visem estimular a adesão de todos os técnicos na implementação das 30 horas. Respostas da gestão/Reitoria: A Direção Acadêmica acolheu a carta de reivindicações e informou que iria estudá-la para responder item a item. Comprometeu-se com a preservação da manutenção de serviços essenciais - aqueles cuja interrupção poderia causar prejuízos irreparáveis, envolvendo bolsas e atendimentos inadiáveis – e a estudar formas de resolver as demais demandas. “Entramos em greve no dia 16 de julho, portanto, fizemos quase 3 meses de greve. A Reitoria tem demonstrado boa vontade na resolução de impasses e reivindicações, como as 30 horas, qualificação dos TAEs, desprecarização de situações insalubres de trabalho, entre outras, mas isso ainda é muito pouco; precisamos que o diálogo siga franco, com prazos definidos de resolução, e que esta administração, como um todo, lute contra a precarização, vassalagem, depredação e privatização que a educação superior pública tem sofrido, amplamente promovido por quem deveria ser seu maior defensor: o governo federal”. (Coletivo Mobilizado dos TAEs do Campus Baixada Santista) Campus Guarulhos Demandas: Desigualdade na relação do número de alunos por técnico entre os campi; um novo sistema técnico e administrativo; segurança, construções e reformas prontas para o retorno ao Pimentas; paridade nas consultas e nos órgãos colegiados. Respostas da gestão/Reitoria: Quanto à distribuição de técnicos, a gestão alega necessitar do término do censo para tomar medidas adequadas. Sobre o novo sistema técnico e administrativo, há uma sinalização de que o Departamento de Tecnologia da Informação está construindo algo, mas sem uma resposta concreta com prazos. Quanto ao retorno aos Pimentas, ficou garantido que os técnicos só voltariam ao campus após a conclusão da obra. O ponto mais polêmico refere-se à paridade: segundo o comando de greve, a gestão não quer levar adiante o que foi decidido no Congresso da Unifesp. Sinaliza que apoia a paridade apenas nas consultas, mas não nos órgãos colegiados (incluindo o Consu). Para o comando, a paridade na consulta é insuficiente e não foi isso que ficou decidido no congresso. “A Unifesp nasceu muito desigual, em diversos aspectos. Ficou claro após esta greve que, caso essas desigualdades não diminuam, a expansão não será consolidada. Nós continuaremos buscando a redução delas”. (Comando de Greve de Guarulhos) Campus Osasco Demandas:Devolução das oito vagas de servidores pactuadas que foram distribuídas para outros campi da instituição; ampliação do número de vagas de servidores nos próximos anos; diminuição do alto déficit de TAEs existente no campus; melhorias nas condições de trabalho. Respostas da gestão/Reitoria: A Reitoria assumiu o compromisso de devolver as vagas ao campus o mais rápido possível, apesar de não ter instituído um prazo. Ressaltou a criação de uma política de gestão das vagas dos TAEs para minimizar as desigualdades. Além disso, está em constante conversa com o MEC para a liberação de novas vagas. “É fato que o crescimento dessa unidade universitária, que se dá com a ampliação do número de alunos na graduação e pós-graduação, não teve a sua devida correspondência na categoria TAE, cuja relação aluno/TAE excede a 30 e até recentemente tal questão sequer era problematizada pela Reitoria”. (Movimento Grevista dos TAEs de Osasco) Campus São José dos Campos Demandas:saúde do trabalhador (insalubridade/precarização das instalações); deficiência no quadro de pessoal do campus; necessidade de crescimento e desenvolvimento responsável/regramento estratégico bem definido; falta de transparência nos atos administrativos e na publicidade dos documentos gerados; descentralização organizacional (padronização entre os campi e fluidez no processo de tomada de decisão). Respostas da gestão/Reitoria: Na avaliação do comando de greve, a Reitoria não ofereceu, ainda, uma resposta satisfatória para as demandas referentes à saúde do trabalhador e ao problema da deficiência no quadro de pessoal do campus, problema agravado pela expansão da pós-graduação sem um planejamento adequado. O comando também aponta falta de transparência nos atos administrativos, na publicidade dos documentos gerados e dificuldade de acesso aos atos administrativos, principalmente à prévia dos documentos produzidos nos debates das instâncias várias (conselhos, comissões, câmaras, entre outros). O comando também aponta para a necessidade de descentralização efetiva na estrutura organizacional para melhor conhecimento das várias realidades locais e melhor trato na tomada de decisões com celeridade e assertividade. “Gostaria de apontar a invisibilidade do corpo de TAEs em nossa instituição que, ironicamente, tem de aderir ao movimento paredista para enumerar em sua pauta de reivindicações questões que fazem parte do programa de campanha da gestão e que obrigatoriamente deveriam ser objeto de apreciação e resolução direta de nossas autoridades competentes. As reivindicações são apresentadas por nós à comunidade universitária na tentativa de alcançar a ressonância e a reverberação necessárias, que as permitam romper as barreiras impostas pelos incautos que não percebem a universidade de forma sistêmica, sob uma perspectiva holística e que vise o bem comum”. (Clayton Rodrigues dos Santos – TAE e membro do Comando Local de Greve de São José dos Campos) Campus São Paulo e Hospital São Paulo Demandas:: 30 horas para o HSP/HU/Unifesp; gestão melhor para APH ; reposição de folgas não concedidas nos dois últimos períodos anuais (retroativos); correção das distorções na carga horária; atendimento às reivindicações dos celetistas do HSP; democratização do HSP. Respostas da gestão/Reitoria: As etapas de flexibilização da jornada de trabalho, a adequação e acertos do número de folgas foram estabelecidas, bem como a publicação da portaria da comissão para gestão do APH. “Audiências sobre 30 horas e a democratização nas universidades foram realizadas pela Reitoria. A discussão das 30 horas foi suficiente. Foi composta uma comissão para o HU, cujo efeito final consideramos positivo. Quando falamos HU, falamos no maior segmento que é a enfermagem”. Comando de Greve do Campus São Paulo e Hospital São Paulo (Sintunifesp) Até o fechamento da edição, os comandos de greve do Campus Diadema e do prédio da Reitoria não responderam aos questionamentos.   Sumário do número 12
Cristina Soreanu Pecequilo No início do mês de outubro a conclusão das negociações da Parceria Transpacifico (TPP, o Pivô Asiático) foi alardeada como prova do sucesso da cooperação global.  A criação da área de livre comércio que une nações dos continentes asiático e americano foi anunciada como a maior do mundo. Sustentando essa avaliação, apresentavam-se em sua lista de membros: Estados Unidos, Japão, Canadá, México, Peru, Chile, Cingapura, Austrália, Nova Zelândia, Malásia, Vietnã e Brunei. Anunciava-se que esse passo era apenas o primeiro da nova experiência de acordos macrorregionais, que incluem as negociações secretas em andamento da Parceria Transatlântico de Comércio e Investimentos (TTIP, o Pivô Transatlântico), com previsão de conclusão em dezembro de 2015. O mundo estaria caminhando em definitivo para uma era de prosperidade e progresso sustentada na liberalização dos fluxos de mercadorias, provando a consolidação da interdependência e da transnacionalização. A globalização, afinal, estaria voltando a seus rumos, após alguns obstáculos avaliados como menores pelos defensores dessas teses. E quais teriam sido essas barreiras? As crises nos Estados Unidos, de George W. Bush, e na União Europeia, que eclodiram no biênio 2007/2008, foram geradas por erros de governantes específicos. São exemplos as guerras contra o terrorismo no Afeganistão e no Iraque promovidas pelos estadunidenses depois dos atentados de 11 de setembro de 2011, que levaram a gastos excessivos, com perda de foco econômico. Por sua vez, a crise da Zona do Euro fora gerada pela irresponsabilidade dos PIIGS (Portugal, Irlanda, Itália, Grécia e Espanha), ao maquiar suas contas públicas para poder pertencer ao seleto clube de nações da moeda comum. O fato de que agências de rating conhecidas, que avaliam se os países seriam ou não confiáveis economicamente, como Standard Poor’s, Fitch Ratings e Moody´s (as mesmas que rebaixaram o Brasil), terem dado nota máxima aos PIIGS pouco antes da sua implosão econômico-social é ignorado, assim como a decisão da União Europeia de aceitá-los no Euro. Os déficits estadunidenses, as ameaças periódicas de que os Estados Unidos “fechem” o governo por não terem dinheiro, é outro fato encoberto. De prático, anunciava-se: o mundo estava mudando e o Brasil mais uma vez ficava de fora. Ora, do TPP e do TTIP não é só o Brasil que fica de fora: os demais “RICS” (Rússia, Índia, China e África do Sul) estão alijados desses processos, assim como a Organização Mundial de Comércio (OMC), instituição multilateral global que zela pelo comércio internacional livre e justo. Nenhum desses acordos exige que padrões ambientais, trabalhistas e sociais elevados sejam seguidos pelos membros, colocando em xeque conquistas nesses setores para impedir a exploração indevida de mão de obra e garantir o desenvolvimento sustentável. Muito pelo contrário, eles traçam suas regras, ignorando esses padrões, assim como iniciativas das Nações Unidas previstas nos Objetivos do Desenvolvimento Sustentável (ODS) que sucedem aos Objetivos de Desenvolvimento do Milênio (ODM). Apesar de pouco noticiado, o TPP já foi alvo de protestos de trabalhadores, especificamente na Alemanha. Esta é uma era de sombras, que ignora as fragmentações contemporâneas, simbólicas, dos fracassos do século XXI e encobre uma guerra de posições. Tal disputa se manifesta em escala global, com tentativas do eixo de poder dominante, Estados Unidos-União Europeia, de barrar a ascensão dos emergentes, sintetizados no acrônimo BRICS, enquanto estes tentam traçar um modelo político-econômico de desenvolvimento e igualdade. Ambos são vulneráveis: seja por seu desejo de manter poder e suas deficiências internas, seja por sua mescla de força e fraqueza. Isso gera instabilidade, pois predomina o vácuo de poder entre os que declinam no eixo Norte, e os que não ascenderam plenamente no eixo Sul. Ao mesmo tempo em que cria mecanismos que desafiam a ordem, como o Novo Banco do Desenvolvimento, instituição financeira organizada para o crescimento dos BRICS, e o Banco Asiático de Desenvolvimento em Infraestrutura, o Sul permanece sujeito às variações do dólar, dos fluxos de crédito e de investimentos ocidentais. A contrarreação hegemônica dos Estados Unidos não se limita a essa esfera, incluindo sua dimensão tradicional de poder: a projeção estratégica, reforçada pela criação de novos comandos militares, como o da África, que permitem sua rápida presença bélica em todos os continentes. Houve o aumento de investimentos em regiões chave para os emergentes, como o Atlântico Sul, zona de produção de gás, petróleo do pré-sal e rota de passagem e intensificação do conflito contra as drogas na Colômbia e no México. Nunca é demais lembrar que desde o fim da Guerra Fria, em 1989, a superpotência restante esteve envolvida em quase uma dezena de guerras e intervenções com (ou sem) o aval das Nações Unidas (algumas justificadas pelo combate ao terrorismo, outras por razões humanitárias associadas à “Responsabilidade de Proteger - R2P”): Iraque (1990/1991), Ex-Iugoslávia (1992/1995), Kosovo (1999), Afeganistão (2001/2014), Iraque (2003/2011), Líbia (2011), sem mencionar os bombardeios unilaterais ao Estado Islâmico iniciados em 2014. Como resultado, ondas de refugiados chegam à União Europeia pelo mar e pela terra, aos quais não se aplica a “R2P”, e se esquecem das convenções de direito internacional. Iniciativas como as do ODM e dos ODS são adiadas ou apenas usadas como retórica diante dos novos blocos econômicos. A xenofobia cresce, ao lado da intolerância, provocada pelo medo do diferente e da mudança. Similar à bipolaridade, dois modelos se confrontam: os do Norte e os do Sul. Muitos falam que estaríamos chegando ao futuro. Não estamos, permanecemos no passado vivendo guerras presentes: ninguém ganha e todos perdem no século dos desequilíbrios. Cristina Soreanu Pecequilo é professora de Relações Internacionais da Escola Paulista de Política, Economia e Negócios da Unifesp (EPPEN/Unifesp), autora de Os Estados Unidos e o Século XXI, A União Europeia e O Brasil e a América do Sul   Sumário do número 12
Andrea Almeida Torres Em tempos de judicialização dos conflitos sociais, acusações de racismo institucional e criminalização de estudantes acontecem na Unifesp - Campus Baixada Santista. Tempos de discussão mais do que necessária, e de forma mais participativa possível, sobre o espaço universitário aberto à comunidade para seu uso, assim como sobre a segurança que queremos nos campi. A questão racial na sociedade brasileira, na universidade federal, virou caso de polícia. Criminalizar estudantes não é o papel da universidade em sua missão de formar futuros/as cidadãos/ãs e profissionais. Debater a questão racial na universidade pública trata-se de defender o acesso à instituição e as condições de permanência, com ensino, pesquisa e extensão de qualidade. Essa formação constitui-se de processos educativos, contínuos e transversais que perpassam o conjunto dos conhecimentos desenvolvidos no universo acadêmico e o respeito aos direitos humanos. Ela deve constar como princípio do projeto político-pedagógico dos cursos e aprimoramentos, assim como nas diretrizes da gestão acadêmico-administrativa. Isso porque é também dever da universidade combater os preconceitos, prevenir as possíveis atitudes discriminatórias e excludentes. Para garantir a totalidade nas reflexões aqui presentes, sobre a sociedade e universidade que queremos, que se posiciona contra o racismo e outros tantos preconceitos e discriminações, não deixaremos cair no esquecimento as características da formação sócio-histórica, política e cultural brasileira: nossas bases coloniais e de exploração de classe, gênero, cor, etnia – resquícios da nossa herança “eurobranca”. E por mais que se negue no discurso, a cultura racista no Brasil ainda é preponderante, mesmo com a nossa mais do que visível miscigenação. Desigualdade social e racismo são duas faces da mesma moeda em nossa sociedade. Uma parcela considerável da população enfrenta cotidianamente esta realidade de violências e violações de direitos, principalmente os jovens negros e indígenas, de baixa renda, das regiões periféricas e desassistidas pelo poder público. Somos todos socializados em uma ideologia discriminatória de que o/a negro/a é menos capaz, menos cidadão, sempre vistos pela ótica burguesa como “a cor da classe perigosa”. Foi possível retratar isso no recente episódio, quando do impedimento, pela polícia, de acesso de jovens negros e não brancos da periferia do Estado do Rio de Janeiro ao chegar de ônibus às praias da zona sul: “Acham que nós somos ladrões porque somos pretos” - retrato fiel de um higienismo social em curso sob o discurso racista de uma cultura dominante da falsa superioridade branca. É preciso, portanto, desconstruir cotidianamente em todas as dimensões da vida social e das instituições, os referenciais preconceituosos enraizados culturalmente na sociedade brasileira, pois o preconceito é um julgamento a priori, superficial, pouco refletido, que valora pejorativamente; é intolerante, leva a atitudes hostis frente ao diferente que chamamos de discriminação. Isso porque o modelo que em geral orienta o pensamento social conservador no Brasil e em boa parte do mundo, é o do homem, branco, adulto, ocidental, heterossexual e dono de patrimônio. Pairamos na falsa compreensão de que somos um país caloroso, harmônico e de tolerância com as diferenças étnico-raciais e de gênero. É mister da universidade que um fato ofensivo a qualquer membro da comunidade não desrespeite direitos e que os enfrentamentos dos conflitos superem a lógica da criminalização e penalização, com medidas alternativas e mais eficazes, como já são propostas em âmbito judicial, a modalidade “Justiça Restaurativa”. É necessário romper com a ordem punitiva como única possibilidade de responsabilização, pois o que realmente conseguiremos de justiça e reconhecimento dos valores da sociabilidade apenas criminalizando e penalizando? Qual será a efetiva transformação das consciências e das atitudes? Como princípio, os direitos humanos possuem em si mesmos uma concepção de universalidade, ou seja, de todos e para todos, em quaisquer circunstâncias e contextos sociais, políticos, econômicos e culturais. Defender os direitos humanos é estabelecer uma cultura que se baseia nos valores do diálogo e respeito. O princípio da Justiça Restaurativa não é apenas o de mediar conflitos. Os atritos são reais, concretos e devem ser explicitados pelos sujeitos agredidos e agressores. A situação de injustiça, violência ou violação não deve ser abafada ou minimizada, para que a reparação seja concreta e propositiva em termos de mudança de atitudes concretas. Agredidos e agressores enfrentam esse conflito pelo diálogo reparador das relações e, obviamente, nada garante que seja tranquilo esse enfrentamento. Porém importa a retratação e a postura de mudança. Trata-se de um princípio de não responder ao mal feito com um mal maior. Em termos jurídicos, a Justiça Restaurativa baseia-se em um procedimento de consenso, em que a vítima e agressor, assim como outras pessoas ou membros da comunidade afetados pela infração, participam coletiva e ativamente na construção de soluções dos traumas e perdas causados. Reparar o dano é o princípio dessa metodologia, além de fazer com que as responsabilidades sejam assumidas. Trata-se de um modelo progressista na resolução dos conflitos, distanciando-se da judicialização formal, que uma universidade pública, socialmente referenciada que queremos construir, pode assumir em sua missão educacional. A prof.ª Dr.ª Andrea Almeida Torres é do departamento de Políticas Públicas e Saúde Coletiva da Unifesp – Campus Baixada Santista. Participa da coordenação do Núcleo de Apoio ao Estudante - NAE/BS e do Núcleo de Estudos, Pesquisa e Extensão em Sistema Punitivo, Justiça Criminal e Direitos Humanos (Gepex.dh)       Sumário do número 12
Em 2014, a Reitoria iniciou um processo de flexibilização da jornada de trabalho dos servidores da universidade, considerando também o Hospital São Paulo, hospital universitário (HSP/HU/Unifesp), segundo o decreto e a regulamentação estabelecidos pelo Conselho Universitário (Consu). Dessa forma, sete setores e 200 TAEs do HU tiveram sua jornada de trabalho flexibilizada com a finalização da segunda fase do projeto piloto aprovado pelo conselho. Em 5 de agosto de 2015, após audiência pública, foi proposta a formação de uma Comissão Especial de Flexibilização da Jornada dos Servidores da Enfermagem do hospital com o intuito de ampliar as 30 horas para os demais setores. Por ser uma das principais reivindicações do Sintunifesp durante o período de greve, foram realizadas várias reuniões entre o sindicato e a Reitoria a fim de se estudar as possibilidades e de apresentar as propostas para essa implementação. O acordo Em portaria publicada no dia 23 de outubro de 2015 foram estabelecidas as etapas para a flexibilização da jornada de trabalho dos demais 742 servidores de enfermagem de 42 setores do HU e ambulatórios, que voltaram ao trabalho no dia 24 de outubro. O acordo proposto pela Comissão Especial de Flexibilização, pelo Conselho Gestor, Superintendência, Diretoria de Enfermagem do Hospital São Paulo e pelos representantes dos servidores técnico-administrativos estabeleceu as seguintes resoluções: - Jornada de 6 horas diárias para os 379 servidores da enfermagem que atualmente trabalham 6h15 por dia, acrescentando uma folga; - Adequação do número de folgas para flexibilização dos 300 servidores de enfermagem que cumprem jornada de 12/36, com a manutenção das folgas estabelecidas anteriormente e o acréscimo de uma folga em meses alternados; - Flexibilizar para 6 horas a jornada dos 63 servidores que cumprem 7 horas por dia, com adequação das folgas de forma que a carga não seja inferior às 30 horas semanais; - Acerto de folgas devidas, referente ao ano de 2014, conforme acordo com a Direção do hospital; - Publicação da portaria da comissão para gestão do Adicional por Plantão Hospitalar (APH) na instituição. Próximos passos Em etapa posterior, a ser realizada a partir de 2016, após a conclusão efetiva da implementação apresentada acima, a Comissão Especial de Flexibilização dará continuidade às suas atividades, com o acompanhamento e avaliação desse processo. Ainda nessa segunda etapa, estão previstos deslocamento de APH de outros setores para enfermagem e realização de concurso público de 2015 (em publicação).     Sumário do número 12
Projeto visa facilitar a integração na sociedade brasileira José Luiz Guerra Um grupo de alunos da Escola de Filosofia, Letras e Ciências Humanas do Campus Guarulhos da Unifesp (EFLCH/Unifesp) criou o Memorial Digital do Refugiado (MemoRef), projeto que visa inserir refugiados na sociedade brasileira, por meio de aulas de português, intervenções culturais e registros escritos, fotográficos e audiovisuais produzidos com base nos trabalhos, além de integrar a comunidade acadêmica a um projeto cultural de cunho humanitário. A ideia surgiu a partir das reflexões da discente de Letras da EFLCH/Unifesp e coordenadora do projeto, Marina Reinoldes, que ministrava voluntariamente aulas na ONG Oásis Solidário, na mesquita do Pari. “Comecei a dar aula em maio e fiz uma publicação chamando outros estudantes da Unifesp para ajudarem. Como a procura foi grande, decidi tentar levar o projeto para a EFLCH/Unifesp e começamos a organizá-lo”, explica. Segundo ela, o formato do MemoRef foi pensado durante cerca de cinco meses. O MemoRef trabalha em três eixos: o primeiro, ministrando aulas gratuitas de português para os refugiados, usando o idioma como meio principal de inserção dos mesmos na sociedade; o segundo, promovendo ações culturais para promover a integralização dos refugiados com a comunidade acadêmica; e o terceiro, elaborando um banco de dados construído a partir das ações culturais, que poderá servir como fonte de dados para futuras pesquisas acadêmicas. O material didático, formulado pela equipe do MemoRef, traz lições que ensinam os alunos a usarem expressões cotidianas, conhecerem os nomes dos estados brasileiros e de objetos comuns. O grupo de ensino é atualmente formado por 11 membros, sendo uma coordenadora, uma vice-coordenadora, cinco organizadores e quatro monitores. As aulas tiveram início em 02 de setembro, contemplando 15 refugiados vindos da Nigéria, Camarões e Síria, todos encaminhados pela Cáritas Arquidiocesana de São Paulo. Além das aulas de português, que ensinam o básico para que os alunos possam se virar em situações cotidianas, os estrangeiros são estimulados a conhecer a cultura brasileira na prática e interagir não só presencialmente, como também à distância, utilizando redes sociais, além de ter contato com particularidades da cultura nacional, como caldo de cana, caipirinha e churrasco. Em uma das atividades extraclasse, os alunos participaram de uma apresentação da Bateria Malagueta, grupo instrumental da EFLCH/Unifesp, tendo a oportunidade de conhecer os nomes dos instrumentos e tocar junto com os ritmistas. Ingrid Albuquerque, vice-coordenadora do grupo, vê o trabalho não apenas como aulas de português, mas como uma ação de perspectiva humanitária e recíproca de ambos os lados. “Eles sentem a energia que nós passamos para eles e se sentem privilegiados quando veem que nós sabemos alguma música ou algum tópico de cultura deles”. Dentro da Unifesp, o projeto conta com o apoio do Laboratório Interdisciplinar de Formação de Educadores (Life), ambiente voltado à realização de práticas pedagógicas, da Cátedra Sérgio Vieira de Mello, que auxiliará na seleção de dados para o memorial, realizará algumas atividades específicas sobre refúgio e mediação com o Alto Comissariado das Nações Unidas para Refugiados (Acnur) e da biblioteca da Unifesp, que cederá espaço para a realização de uma exposição fotográfica que apresentará o olhar do refugiado sobre a comunidade em que vive. As coordenadoras citam os diferentes níveis de português como uma das dificuldades a serem enfrentadas no trabalho. “Alguns alunos estão com muitas dificuldades, pois só sabem o árabe e temos de dar uma atenção especial a eles. Em contraposição alguns querem entrar no ensino superior e estamos procurando atender essa necessidade”, diz Ingrid. Os alunos que têm mais dificuldades são acompanhados mais de perto por um dos monitores que dão o suporte aos professores. Possibilidade de expansão Quando redigido, o projeto do MemoRef previa o atendimento a um grupo de 15 refugiados em aulas que iriam de setembro a dezembro de 2015, com possibilidade de abertura de nova turma em 2016. No entanto, a aprovação do projeto no programa Pró-cultura da Unifesp e a visibilidade que a ação ganhou dentro e fora da universidade fizeram com que a organização sonhasse mais alto. “Escrevemos o projeto até dezembro porque estávamos com medo de pensar muito alto e não conseguirmos fazer o que estávamos propondo. No entanto, bateu aquele arrependimento, porque estamos vendo que é possível organizar e por isso vamos procurar outros meios de continuar o projeto”, explica Marina. Atualmente, a cidade de Guarulhos abriga 242 refugiados, 72 deles chegaram em 2015. A intenção do MemoRef é a de que, até o final de 2016, esses refugiados passem pelo curso, meta que Marina encara como um sonho. “Espero que nós consigamos atender a essa demanda, pois faz parte do papel da universidade. É algo que eles precisam e é uma forma de nós retribuirmos à comunidade todo o aprendizado que a gente tem dentro da universidade”, finaliza. A voz dos refugiados Luc Tadieu Kovam, de 45 anos, veio de Camarões e é um dos estudantes do MemoRef. Ele afirma que as aulas são boas, assim como os professores. Por ter o francês como idioma nativo, sente um pouco de dificuldade com o português. “Entender é fácil. Difícil é falar. Consigo fazer tudo sozinho e quando preciso de algo que não sei o nome, aponto”. Para ele, a evolução é nítida, pois quando chegou não sabia nenhuma palavra em português. “Como você vai se relacionar com uma pessoa sem falar a língua dela? Você tem que aprender”, diz. Já o nigeriano Ogurieti Marvin Tunde, de 30 anos, está achando fácil aprender o português e afirma que recebe muita ajuda dos professores. Assim como Luc, ele também já consegue pedir as coisas em português, mas acha o idioma difícil em comparação com o inglês, sua língua nativa. “O vocabulário do português é muito diferente e falar e escrever ainda é muito difícil”, completa.   Sumário do número 12
Programa de humanização do ambiente hospitalar entra em nova fase com uma proposta de integração de projetos Da redação Colaborou Rogério Dias Se relações entre seres humanos são sempre complexas, no ambiente hospitalar elas podem, facilmente, adquirir um tom dramático. Mesmo a rotina normal e corriqueira é, inevitavelmente, marcada pela tristeza, ansiedade e sentimentos de frustração. Para enfrentar esse problema, ou pelo menos atenuar os seus efeitos, o HSP/HU/Unifesp desenvolve, há mais de dez anos, um programa de humanização da prática hospitalar. Desde outubro, o processo entrou em uma nova fase, a partir de iniciativas assumidas pela Reitoria, englobadas pelo programa A Semente está Lançada, com previsão para começar a ser implantado até o fim do ano. “As questões das relações humanas sempre me incomodaram, da forma com que convivemos com os nossos pacientes e como convivemos entre nós mesmos também”, afirma Rosileide Pinheiro, servidora do setor de Reumatologia Pediátrica do HSP/HU/Unifesp, uma das coordenadoras do novo projeto de humanização. “Como são as nossas relações diárias? O que fazemos para humanizá-las? Como é a dor do outro que vem para ser atendido? Quando o funcionário ou o servidor precisa dar uma notícia mais difícil e ele não está em um bom dia, como que faz?”, indaga Rosileide. Coordenado por Angélica Belasco, o projeto de humanização mais antigo atua, desde 2004, em diferentes áreas e de diversas maneiras. O “Amicão”, lançado em março de 2006, emprega um cão da raça Golden Retriever, hoje com seis anos de idade, que passeia pelas unidades pediátricas do hospital nas tardes de quarta-feira. O “Ternura do Canto” é protagonizado pela dupla sertaneja Ricardo e Eduardo. Eles passam cantando músicas para os pacientes pelo menos uma segunda-feira por mês, há cerca de três anos. São alguns dos exemplos de iniciativas que acabam tendo um impacto muito positivo para os pacientes e para o meio hospitalar como um todo. “Você vê aquele ambiente que era pesaroso, triste, e acaba tendo uma modificação. Nós percebemos que o cachorro não é só um cachorro, parece que ele é um funcionário”, diz Beatriz Batista, enfermeira do HSP/HU/Unifesp que atualmente atua na educação permanente e estuda o assunto em sua pós-graduação. Beatriz avalia que por mais que sejam projetos isolados dentro do hospital, tendo pouco contato entre si, por se desenvolverem em áreas diferentes, eles acabam fazendo a diferença. A enfermeira conta que não tinha muito envolvimento com a questão da humanização, até que percebeu que sua vida era uma correria e que acabava dando mais atenção às tecnologias e a realização de técnicas do que para o próprio paciente, e isso a incomodava: “Eu não queria ser assim. Eu queria ser uma pessoa dedicada ao paciente. São pequenos detalhes que às vezes acabam passando despercebidos, mas que para o paciente é muito importante”, completa Beatriz. E é justamente o fato de esses projetos estarem desconexos que levou Rosileide a procurar a reitora Soraya Smaili para que algo fosse feito com o objetivo de integrar todas as ações humanizadoras. A servidora conta que existem ótimos trabalhos em desenvolvimento: “No setor de Reumatologia Pediátrica, há uma assistente social dedicada exclusivamente ao atendimento às crianças. Elas recebem vale-transporte, cesta básica e atendimento psicológico de fisioterapeuta”. Segundo Rosileide, antes do processo de humanização atuar nessa área, havia casos em que as crianças não tomavam os remédios prescritos ou faltavam às consultas por falta de recursos da família. Em muitos casos, os pais diziam que tinham que optar entre comprar comida ou remédio. Hoje, a realidade é bastante diferente. Os projetos não são direcionados apenas aos pacientes. Beatriz nota que há uma melhora evidente no humor dos funcionários nos dias em que ocorrem algumas das atividades marcadas: “Nós, assim como os pacientes, sentimos uma diferença. Nós sabemos que naquele dia vai ter teatro e fazemos de tudo para dar uma ‘fugidinha’ do setor, assistirmos a peça e voltarmos. É criada uma expectativa para esses dias”, conta. Além de integrar as atividades, Rosileide também propõe a mudança nas atitudes dos funcionários. Simples gestos como segurar a mão, olhar no olho e ouvir o paciente são algumas maneiras de mudar essa relação, resgatar a autoestima e quebrar essa barreira funcionário-paciente: “A humanização é isso, se importar com a dor do outro. Não é que o paciente vai ser curado, mas a partir do momento em que você se importa com o que o outro está sentindo, ele reconhece que não está sozinho”, comenta. Encontro cria Núcleo de Humanização No dia 20 de outubro de 2015 ocorreu o primeiro encontro “A Semente está lançada”, do núcleo humanizar Unifesp. O evento aconteceu no Campus São Paulo com atividades durante o dia todo. Mais do que uma iniciativa, o programa “A Semente está lançada” pretende provocar uma reflexão por parte de todos que trabalham no HSP/HU/Unifesp: “Nós precisamos pegar este momento e refletir, cada um de nós. Refletir se cada um está fazendo a sua parte. Porque para nós, que lidamos com a área da saúde, existe uma linha muito fina entre o estar ou não doente. Hoje estamos aqui, mas amanhã pode ser diferente. Então, todos os dias temos que ser humanos. E isso não pode mudar”, conclui Rosileide. Os projetos não são direcionados apenas aos pacientes. Beatriz nota que há uma melhora evidente no humor dos funcionários nos dias em que ocorrem algumas das atividades marcadas: “Nós, assim como os pacientes, sentimos uma diferença. Nós sabemos que naquele dia vai ter teatro e fazemos de tudo para dar uma ‘fugidinha’ do setor, assistirmos a peça e voltarmos. É criada uma expectativa para esses dias”, conta. Além de integrar as atividades, Rosileide também propõe a mudança nas atitudes dos funcionários. Simples gestos como segurar a mão, olhar no olho e ouvir o paciente são algumas maneiras de mudar essa relação, resgatar a autoestima e quebrar essa barreira funcionário-paciente: “A humanização é isso, se importar com a dor do outro. Não é que o paciente vai ser curado, mas a partir do momento em que você se importa com o que o outro está sentinndo, ele reconhece que não está sozinho”, comenta.   Sumário do número 12