Publicações

logo_unifesp
Antonio Saturnino Quando tinha seis anos, Rodrigo More criou uma história em quadrinhos com caravelas e navios, revelando sua paixão pelo mar desde muito cedo. Seu sonho de criança era um dia servir à Marinha, o que não aconteceu. Acabou estudando em colégio militar, em uma escola preparatória de cadetes. Não seguiu carreira e, alguns anos depois, estudou na Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo (USP). O curso da vida, aparentemente, o afastara da sua paixão pelo mar. Mas o Direito se encarregou de levá-lo para as águas. Hoje ele é membro do Grupo de Trabalho (GT) da Comissão Interministerial para os Recursos do Mar, integra a delegação brasileira na Organização das Nações Unidas (ONU), na discussão sobre a ampliação da plataforma continental brasileira, e leciona no Campus Baixada Santista da Unifesp, no Departamento de Ciências do Mar. “No meu mestrado e doutorado, desenvolvi teses sobre Direito Internacional Público, sempre abordando assuntos políticos estratégicos ligados a segurança e defesa. Isso me aproximou muito do sistema do mar, já que hoje o espaço brasileiro mais relevante, do ponto de vista estratégico, para as próximas décadas, é o espaço oceânico”, comenta. Nascido em 1973, em São Paulo, aos seis anos mudou-se com seus pais e os três irmãos mais novos para Marília. Lá o pai tinha uma empresa e proporcionava uma vida confortável à família. Porém, durante o Plano Bresser o negócio quebrou. “Às vezes não sabíamos como compraríamos comida. Houve muitos dias que nós tínhamos apenas feijão e farinha à mesa. Eu e meus irmãos estudávamos no melhor colégio da cidade, e havia o risco de termos que mudar de escola”. Religioso, ele se lembra de pessoas iluminadas que cruzaram seu caminho e o ajudaram naquele período. O colégio onde estudava propôs aos seus pais que pagassem quando tivessem condições. Ao todo foram quase quatro anos sem pagar. Depois, aos quinze anos, voltou a São Paulo, pois queria fazer um curso preparatório para a Marinha. Nesse período morou com a avó e um tio, que custeou os estudos. “Eu estudava como um louco, cerca de 12h por dia. Se eu fosse bolsista, passasse em primeiro lugar, eu devolveria 100% do investimento para o meu tio. Nós éramos pobres, era importante devolver o dinheiro. Consegui devolver uma parte e, dos 17 concursos que eu prestei, passei em 11, muito bem colocado em muitos deles”, lembra emocionado. Porém, no concurso que ele almejava acima de todos os demais, o da Marinha, ele não foi aprovado. No dia da prova teve o famoso “branco”. Eliminou algumas opções, e decidiu ingressar na Escola Preparatória de Cadetes do Exército, em Campinas. Ele descreve a experiência como fantástica, em razão do nível do ensino e dos valores que aprendeu, como honra, verdade, camaradagem e o espirito de corpo e de união. Hoje, olhando para trás, ele percepe que tudo na vida tem um propósito. “Eu fui o cadete que dançou com Vanessa, minha esposa, em sua festa de 15 anos. Se eu tivesse entrado na Marinha, não teria entrado no Exército, não dançaria a valsa com ela e não teria encontrado a mulher da minha vida”. Quando comunicou a seu pai que não seguiria carreira militar, o patriarca dos More tentou demovê-lo da ideia e perguntou o que ele faria ao sair do colégio. Ele falou a primeira coisa que lhe veio à mente: “Direito na USP”. A rotina intensa de estudos no colégio o ajudaram a estar bem preparado para o vestibular. Na universidade ele desenvolveu sua principal característica, tanto no âmbito pessoal quanto profissional: ser um mediador. “Foi um divisor de águas para mim. Saí de um ícone ligado à ditadura militar para uma instituição que podia ser considerada um símbolo da luta contra o regime. Eu era, e sou, um cara de centro. Nunca fui radical nem para um lado e nem para outro. Meu perfil é de intermediação. Se é preciso ser um pouco mais agressivo, eu sou um cara duro, mas com uma postura mais conciliadora”. Casado com a debutante com quem ele dançou quando tinha 18 anos, More tem um filho de dez anos, o Enzo, e sua esposa está esperando o segundo filho, que nascerá em janeiro. O nome já está escolhido, Matteo. “Dizem que é como se fosse tudo igual de novo. Tenho minhas dúvidas, pois somos pessoas diferentes após dez anos, estamos mais calejados. Talvez eu seja menos rígido na minha segunda experiência da paternidade”, comenta emocionado mais uma vez. Ele sabe, porém, que haverá uma grande diferença na criação do segundo filho: a escassez de tempo que poderá passar com ele, em razão das muitas viagens que realiza por causa do seu trabalho. Muito ligado à família, More diz que quando viaja, não vê a hora de voltar. Adora sua casa e ama estar junto da sua família. Quando fica fora por muito tempo, inclusive, leva seu travesseiro. “Adoro meu travesseiro. Não consigo sequer dormir em um hotel sem ele”. Em 2011, ele escreveu o artigo intitulado Quando os Cangurus Voarem. O título faz alusão ao episódio conhecido como “Guerra da Lagosta”, da década de 1960. À época, Brasil e França tiveram divergência diplomática, pois o governo brasileiro autorizou navios franceses a pescar em nosso território e eles começaram a capturar lagostas, o que incomodou muito os lagosteiros da região. A justificativa que eles deram foi que eles apenas capturavam quando elas saltavam, e que nesse momento ela virava peixe. O almirante Paulo Moreira retrucou: “Se lagosta quando salta vira peixe, quando o canguru pula, torna-se uma ave”. O texto de More aborda uma resolução feita para a Comissão Interministerial para os Recursos do Mar, que permitiu que fossem feitas pesquisas sobre petróleo em áreas ainda não recomendadas pela ONU, e o conhecimento científico é muito importante para defender a soberania territorial. “A lagosta é um crustáceo do meiobêntico. É um ser vivo do fundo marinho e não pode ser ‘pescado’. É um conhecimento importante para a proteção do seu recurso. Usei a brincadeira para dizer que a ciência é necessária para o conhecimento do mar e sua defesa jurídica. Conhecer o oceano é essencial para defender a sua soberania”, comenta. Ele conta a história: “Naquela época fui a uma palestra no Rio de Janeiro. Cheguei mais cedo e encontrei com o almirante Jair Alberto Ribas Marques, que é perito nosso na ONU. Me apresentei, e ele falou ‘Você é o rapaz do canguru. Minha assistente gosta muito dos seus artigos. Você precisa ir lá nos visitar. Estamos indo agora para a Dinamarca e na volta você vai nos visitar’. Lá o assessor do primeiro ministro e o advogado deles perguntaram onde estava o advogado da delegação brasileira, que ainda não existia. Ele, com muita perspicácia falou que havia ficado no Brasil. Saindo de lá ele foi para Nova York e me ligou, dizendo: “Dr. More a partir de agora você é nosso advogado de plataforma continental”. Foi tão bem aceito que passou a integrar o GT do Plano de Levantamento da Plataforma Continental Brasileira (Leplac) na Comissão Interministerial para os Recursos do Mar, sendo depois designado para o GT responsável pela elaboração da proposta política (final) que seria apresentada à ONU. “Não poderia haver melhor oportunidade para mim. Costumo dizer que ninguém aprende a nadar por meio de manuais, precisa pular na água. Eles me jogaram na água, não poderia ter havido uma experiência melhor”. Por ser um membro do GT, em agosto desse ano foi convidado a compor a delegação que apresentou a Submissão Parcial Revista da Margem Sul ao plenário da Comissão de Limites da Plataforma Continental, na ONU. Sobre as pessoas importantes na sua carreira, ele menciona: “Conheci pessoas iluminadas, que foram e são extremamente importantes na minha vida. Araminta Mercadante, Vicente Marotta Rangel, Guido Soares e o Fernando Mourão. Serei sempre grato a eles, que me ajudaram muito no início da minha carreira. Minha família, que me apoiou em todos os momentos e, principalmente, meu tio Benê, que reconheço como meu segundo pai.Acho que a melhor forma de devolver o que eles investiram em mim é compartilhar o que aprendi e vivi”. Ele completa: “Eu queria estar no mar. Dei uma volta imensa, passando pelo Exército, para chegar onde eu queria. Mas cheguei bem acompanhando e feliz. Hoje eu leciono em Santos, estou dentro da praia e o mar é a minha vida. Se hoje eu sei nadar, não é porque fiquei lendo um manual, mas porque um dia me jogaram na água”.   Sumário do número 12
Evento abriga 1º Concurso de Fotografias, Poemas Curtas-metragens Valquíria Carnaúba Promovida pela Coordenadoria de Política Cultural da Pró-Reitoria de Extensão (Proex), a primeira edição da Semana Unifesp Mostra a sua Arte, com realização planejada para ocorrer entre os dias 16 e 19 de novembro, integra-se ao esforço para difundir, integrar e fomentar a produção artística entre a comunidade acadêmica. Simultânea às atividades que ocorrem durante a Semana de Consciência Negra, a ideia foi concebida em um formato inédito, dentro de uma proposta multi-campi. Para abrir a semana, foi planejada uma exposição e divulgação dos trabalhos vencedores inscritos no 1º Concurso de Fotografias, Poemas e Curtas-metragens (veja o box). Além disso, ocorrerão palestras, saraus e exibições de filmes ao longo dos quatro dias para contemplar as expectativas da comunidade acadêmica, a quem foi oferecida a oportunidade de vivenciar novamente a experiência do I Congresso Acadêmico, realizado em junho: as apresentações do Palco Aberto. Assim como antes, são previstas diversas apresentações artísticas, de duração máxima de 10 minutos, com práticas denominadas “artes da cena” (música, dança, teatro, performance, circo e poesia). Cultura: política institucional Diversos esforços para a consolidação de uma política cultural na universidade marcam a Proex em 2015. Como estratégia para integração da universidade, composta por diversos campi cujas características estão intimamente relacionadas às regiões em que se localizam, surge a promoção das iniciativas culturais de forma a criar uma nova prática de produção de conhecimento. Nesse contexto, ações institucionais são desenvolvidas atualmente com o apoio da Pró-Reitoria de Extensão (Proex), da Pró-Reitoria de Assuntos Estudantis (Prae) e de outras instâncias da universidade. Porém, não há uma diretriz conjunta para essas iniciativas, tampouco existem recursos suficientes para que as atividades continuem a fomentar novas ações e formar outros agentes. A Coordenadoria de Política Cultural surge então como proposta para estimular tanto a produção como a circulação de atividades artísticas e culturais nos e entre os campi. Ana Maria Pimenta Hoffmann, professora adjunta de História da Arte na Escola de Filosofia, Letras e Ciências Humanas da Unifesp (EFLCH/Unifesp) - Campus Guarulhos, à frente da coordenadoria, afirma que é constante a busca por interlocução com as câmaras técnicas de extensão e direções acadêmicas de forma a mapear, promover e dar visibilidade a artistas e coletivos da comunidade acadêmica. “Cada vez mais, é consensual a ideia de que a dimensão cultural, tanto na universidade como fora dela, desempenha um papel central no processo de formação. Por meio dela, pode-se abrir caminho para a diversidade e o pluralismo, redefinir determinados valores e recriar a própria vida em comunidade”. As propostas da atual gestão englobam apoio ao projeto Rede Procultura Unifesp e à formação de núcleos de produção e difusão, realização de módulos de rodízio de curta duração, organização de editais pró-cultura, promoção de seminários sobre arte, manutenção e continuidade dos grupos e companhias artísticas, estímulo à Residência Artística, além do planejamento de mostras culturais itinerantes e de festivais de arte. “Paralelamente, já existiam notáveis impulsos institucionais para a elaboração de planos de cultura em todos os campi. A Semana Unifesp Mostra a sua Arte deve acontecer como resultado direto dessa nova fase na Proex”, afirma Ana. Ela afirma ainda que a expectativa é que formatos semelhantes ao evento de novembro cheguem para ficar na grade da programação universitária e integrem outras ações culturais, a exemplo das oficinas no campus de extensão da zona leste e parcerias cumpridas entre o Ministério da Educação e o Ministério da Cultura. Universidade realiza concurso de fotografias, poemas e curtas-metragens Em outubro, foram abertas as inscrições para o 1º Concurso de Fotografias, Poemas e Curtas-Metragens da Unifesp, com participação aberta a discentes regularmente matriculados nos cursos de graduação, pós-graduação lato ou stricto sensu e extensão da Unifesp, além de residentes e funcionários (docentes, técnicos administrativos ou terceirizados). Cada concorrente teve a oportunidade de inscrever quantas fotografias, poemas ou curtas-metragens desejasse, com a temática “Convívio”, e ter suas obras avaliadas pela Coordenadoria de Políticas Culturais da Pró-Reitoria de Extensão da instituição. Como prêmio, os três primeiros colocados de cada categoria foram contemplados com um tablet. Já os dez trabalhos mais bem avaliados receberam certificação, livros da Editora FAP-Unifesp e terão seus trabalhos ampliados e expostos durante o festival Semana Unifesp Mostra sua Arte, permanecendo disponíveis ao público de todos os campi por mais uma semana após o final do evento.   Sumário do número 12
Carine Mota “Estamos diante de uma geração que utiliza os meios tecnológicos como recurso principal para lidar, superficialmente, com seus problemas de relacionamento”, afirma Denise De Micheli,chefe da disciplina Medicina e Sociologia do Abuso de Drogas (Dimesad) do Departamento de Psicobiologia da Unifesp. Em entrevista, Denise discute algumas das características do perfil dos adolescentes usuários de internet e mídias digitais, e a possível influência desse comportamento na sua qualidade de vida. Boa parte dos dados foram obtidos a partir de uma pesquisa para dissertação de mestrado orientada por Denise e apresentada em 2014 por Fernanda Davidoff ao Programa de Pós-Graduação em Educação e Saúde na Infância e na Adolescência da Unifesp. Entrementes - Há uma relação entre o aumento no uso das redes sociais com o crescimento dos casos de depressão e suicídio? Denise De Micheli - Não há, até onde sabemos, uma relação linear. O que se percebe é que devido ao aumento no uso de redes sociais pelos adolescentes, esses estão construindo outros níveis de amizade e sociabilidade. Níveis estes considerados distantes e superficiais, sem aquisição de vínculo. Isso sim sabe-se que é muito prejudicial. E – É possível um uso controlado das redes sociais e aplicativos de relacionamentos? DDM -Em se tratando de adolescentes, a questão do controle é mais complicada, pois o momento que eles vivem, do ponto de vista neurobiológico, não permite ainda um controle dos impulsos e autorregulação. Nesse caso, são necessárias interferência e monitorização dos pais, por meio do estabelecimento de regras de uso e tempo.Quando se trata dos adultos, o controle também não é tão simples, embora do ponto de vista neurobiológico o adulto já tenha maior controle de impulsos. Já existem alguns estudos que mostram que a navegação na internet, como em casos de jogos, por exemplo, ativa alguns neurotransmissores (a dopamina em especial) em áreas de recompensa do cérebro e isso causa prazer. É extremamente reforçador. Neste caso, o autocontrole também acaba sendo difícil. Por essa razão já existem alguns serviços para atender dependentes de redes sociais. E -Pessoas que buscam relacionamentos em aplicativos, portais e sites têm que tomar quais precauções? DDM -As pessoas devem tomar muito cuidado. Uma das questões que se observa na rede é que as pessoas, em geral, expõem seu melhor lado e muitas vezes mentem ou omitem informações de acordo com sua conveniência. Esse é o maior perigo. Os pais devem monitorar os filhos, orientando-os a não manter conversas com desconhecidos, a não fornecer informações pessoais a ninguém.; E - Quais os prejuízos do uso excessivo das tecnologias, principalmente antes de dormir? DDM -O indivíduo que se mantém conectado antes de dormir não permite que seu corpo e mente relaxem. Não são raras as pessoas que adormecem com o celular nas mãos, por estarem conectadas e interagindo em redes sociais até tarde da madrugada. Isso impede o completo relaxamento, não permite que o indivíduo tenha as horas de sono necessárias para seu bem-estar no dia seguinte. E, com isso, tem-se uma pessoa cansada física e mentalmente. E - Como os pais podem orientar seus filhos ao utilizarem as redes? DDM -Uma conversa transparente e verdadeira é sempre o melhor caminho. Explicar os perigos reais que crianças e adolescentes podem correr ao se exporem, mantendo contato com estranhos na internet, é sempre o melhor a se fazer. Os jovens precisam entender as razões pelas quais eles não devem se conectar a estranhos. Caso contrário, não fará sentido esse alerta e certamente irão burlar ou infringir as regras. Eles devem saber que podem correr perigo ao passar informações pessoais, como endereço, telefone, entre outras coisas. E - Por que atualmente os jovens e adultos têm mais dificuldade para interagir fora do mundo virtual? DDM Cada vez mais as pessoas apresentam dificuldades em lidar com seus sentimentos e dificuldades. A internet e as redes sociais acabam alimentando essa dificuldade, uma vez que proporcionam um contato à distância e de forma superficial. Hoje muitos adolescentes iniciam e terminam um relacionamento por meio do WhatsApp, e com isso não estabelecem vínculos, tampouco vivenciam a expectativa do sim do início do namoro e nem a tristeza do término. Tudo fica banal e simples, não se lida com sentimentos. E - Como os pais podem perceber que seus filhos sofrem cyberbullying e como os jovens podem se proteger dessas agressões? DDM - Os pais devem sempre estar atentos a qualquer manifestação de comportamento diferente dos filhos, seja para o lado do isolamento e depressão, seja para o lado da euforia e extroversão. Qualquer um dos extremos deve ser observado com atenção. E - Quais fatores do cyberbullying fazem os jovens chegarem ao ponto de pensarem no suicídio? DDM - O jovem que pensa em suicídio já vivencia uma situação interna emocional grave. O cyberbullying somente vem a agravar a situação. Brasil lidera em tempo gasto nas redes   O número de usuários de telefones móveis cresceu 7% no Brasil de outubro de 2014 para março de 2015, correspondendo a quase 39 milhões de novos adeptos. O país é líder global em maior tempo gasto nas redes sociais e elas atendem a uma demanda social 60% maior que a média mundial. São gastos em média 21 minutos em cada rede, tempo 60% maior que a média mundial; 650 horas nas redes sociais/mês e 290 horas a mais nelas do que navegando em portais. Segundo a ComScore, o sistema Android corresponde a 72% do acesso móvel dos brasileiros, seguido por 15% do sistema IOS. O percentual de brasileiros de 10 anos ou mais que são usuários de internet chegou a 55%, o que corresponde a 94,2 milhões de usuários. A atividade mais realizada pelos usuários nos três meses anteriores à pesquisa é o envio de mensagens instantâneas, como por exemplo o chat do Facebook, Skype ou WhatsApp (83% dos usuários de internet). A participação em redes sociais figura entre as ações mais citadas, com 76%. Os dados são da 10ª edição da pesquisa TIC Domicílios, divulgada pelo Comitê Gestor da Internet no Brasil (CGI.br), por meio do Centro Regional de Estudos para o Desenvolvimento da Sociedade da Informação (Cetic.br), do Núcleo de Informação e Coordenação do Ponto BR (NIC.br).   Sumário do número 12
Porto de Santos Saúde e trabalho em tempos de modernização Maria de Fátima Ferreira Queiróz, Rosana Machin e Marcia Thereza Couto Este livro procura investigar as singularidades do processo de modernização do Porto de Santos, sobretudo com as transformações socioeconômicas ocorridas no país nos anos 1990, e suas consequências para a saúde dos trabalhadores. Os autores questionam como uma categoria profissional associada à valorização de atributos morais como coragem, força, honra e virilidade – e cuja representação predominante no imaginário social ainda é vinculada a atividades essencialmente masculinas e baseadas na força muscular – tem lidado com a modernização e com a nova gestão do emprego portuário. O resultado é uma profícua análise de como tais mudanças ecoam nas formas de sociabilidade e, também, nas experiências fisiológicas, orgânicas e simbólicas de saúde e adoecimento. A redução da força de trabalho, a ampliação das inovações tecnológicas, a flexibilização e a desregulamentação dos direitos sociais e a introdução de novas formas de gestão são exemplos de medidas que vêm evidenciando uma intensa transformação, caracterizada por precarização, automação e heterogeneização do trabalho. Ancorada na articulação entre ciências da saúde e ciências sociais em saúde, esta obra oferece uma visão interdisciplinar que associa diferentes olhares sobre a modernização portuária. A investigação de pesquisadores com sólidas formações em suas áreas específicas é combinada com a narrativa dos próprios operários do porto, que se colocam em face de uma realidade de perdas e desestruturações do seu trabalho, percebido como uma atividade complexa, gigantesca, por vezes penosa, mas da qual sobressai a ideia de gosto e satisfação. Poder na França no Século XX Jean-Yves Mollier Jean-Yves Mollier, um dos melhores historiadores da edição contemporânea, reconstrói, nesta obra, a história de um século do tumultuado triângulo amoroso composto pelo comércio de livros, pela imprensa e pelo poder. Se a história mostra que os jornais e as editoras tradicionalmente ignoravam e até combatiam a dinâmica do poder político, o século XX, por sua vez, foi marcado pelo estabelecimento de vínculos escusos e pela crescente harmonização entre esses dois mundos. Tentar decifrar esse movimento incessante de proximidade é a tarefa a que se propõe o autor, que evidencia o papel significativo que as diversas instâncias do poder – estatais, financeiras, políticas e religiosas – desempenham na evolução das empresas do setor editorial, misturando a política e a ideologia com a cultura e a economia. Possibilitado pela recente e tardia liberação de acesso a importantes fontes primárias, como os arquivos da gigante Librairie Hachette, esse estudo apresenta uma síntese inédita que tenta abarcar no mesmo olhar o conjunto do sistema midiático, da imprensa escrita à internet. Partindo da ideia de que, atualmente, a mídia audiovisual se integra em conglomerados que englobam editoras, revistas e diários, o livro desvenda o processo de formação dos grandes grupos de comunicação que agregam imprensa e edição e disputam entre si o domínio dos mercados de educação, entretenimento e informação na França. Jean-Yves Mollier é doutor em história pela Universidade Paris I (Panthéon-Sorbonne) e professor da Universidade de Versalhes Saint-Quentin-en-Yvelines. Dedica suas pesquisas sobretudo à história do livro e das mídias impressas e eletrônicas. Fanny e Margot, Libertinas O aprendizado do corpo e do mundo em dois romances eróticos setecentistas Mariana Teixeira Marques Dois livros publicados quase simultaneamente e de enorme êxito perante o crescente público leitor do século XVIII; duas protagonistas, de origem humilde, que contam suas próprias histórias e relatam como, tendo entrado para o mundo da prostituição e da libertinagem, conseguem chegar a uma vida de conforto material; dois autores acusados de obscenidade que tiveram de prestar contas a autoridades policiais. Essas são algumas das semelhanças entre Memoirs of a Woman of Pleasure (1748-1749), de John Cleland, e Margot la ravaudeuse (1750), de Fougeret de Monbron, romances que instigaram esta análise comparada de Mariana Teixeira Marques. A autora conduz o leitor pelas veredas da produção da literatura erótica na Inglaterra e na França setecentistas, narrativas que circularam com bastante vigor, mas que apenas a partir de meados do século XX passaram a ser vislumbradas pela crítica. Além disso, esta obra aprecia um aspecto crucial para a compreensão da literatura europeia da época: trata-se das trocas, dos cruzamentos, das apropriações e influências culturais entre os dois países em questão, o que favorece a compreensão dos pontos de contato entre ambas as tradições literárias. Ao mesmo tempo, cada uma das narrativas tem sua origem em um universo socioeconômico e cultural particular, dentro da perspectiva iluminista, cujas especificidades também são contempladas pela autora. A ficção libertina é uma das múltiplas conexões entre as literaturas da França e da Inglaterra e, nesse sentido, pode servir de convite a aspectos da experiência cultural europeia nem sempre alumiados pela crítica literária tradicional. Democracia e Estado de Exceção O aprendizado do corpo e do mundo em dois romances eróticos setecentistas Edson Teles Há muito mais de estado de exceção nas democracias contemporâneas do que gostaríamos de admitir. Essa é a provocação central que Edson Teles nos desperta ao mesclar a experiência do vivido com o exercício da reflexão. Tomando como ponto de partida uma original comparação entre os processos de acerto de contas com as violências do apartheid sul-africano e da ditadura civil-militar brasileira, este livro nos convida a um percurso teórico pela Filosofia Política no qual os conceitos vão sendo construídos e definidos, criticamente, na própria fluidez do texto. De um lado, a lenta e controlada transição brasileira turvou o acesso à memória política, consagrando a impunidade dos torturadores. Medidas de reconhecimento esparsas e pouco articuladas entre si expressam o mal-estar de um passado que não passa. De outro, a mudança de regimes na África do Sul foi pautada pela criação de uma esfera pública de partilha dos sentimentos de horror após décadas de segregação racial. Em vez de silenciamento e esquecimento, emergiu um potencial redentor da narrativa, contribuindo decisivamente para a reconstrução dos laços sociais e da confiança cívica nas instituições do Estado. Em contrapartida, apesar de reconhecer os avanços da Comissão da Verdade e Reconciliação criada por Mandela, o autor não deixa de apontar as contradições desse processo. As exigências por justiça seguem em uma sociedade ainda marcada pela desigualdade econômica e pelo preconceito. Essa obra consiste em uma contundente denúncia dos bloqueios que ainda temos de romper para fazer frente às violências que não cessam. Seu maior mérito é nos mostrar a importância de mobilizar a memória das violações de direitos humanos como uma forma de radicalizar a democracia nos dias atuais.   Sumário do número 12
Multiplicação de aplicativos, chats e redes dedicadas a relacionamentos coincide com o crescimento global da solidão, depressão e de taxas de suicídio entre jovens Carine Mota Multiplicação de aplicativos, chats e redes dedicadas a relacionamentos coincide com o crescimento global da solidão, depressão e de taxas de suicídio entre jovens O mundo contemporâneo apresenta um paradoxo: a internet multiplica quase ao infinito as possibilidades de encontros entre pessoas, ao passo que também há uma epidemia global de casos de solidão, depressão e aumento no surgimento de doenças psíquicas. Algumas são versões de aflições antigas, apenas renovadas pela era da banda larga móvel. Outras são específicas dos novos tempos. São bem conhecidas, e usadas por milhões, as redes sociais, aplicativos, chats, portais e sites de relacionamentos, como o Facebook, Tinder, Happn, Flert, DateMe, Par Perfeito, Namoro On, Pof e muitos outros. Há também aplicativos mais especializados - como o Coroa Metade, Amor de Peso, Scruff, Grindr, Namoro Estável - que oferecem opções variadas, por exemplo, para pessoas com idade acima de 40 anos, obesos, homossexuais, funcionários públicos ou para aqueles que buscam relacionamentos casuais.Mas, o isolamento físico, típico do usuário que fica horas diante da tela do computador, contribui para piorar os sentimentos de depressão e solidão. Um estudo realizado em 2012 pelo Human-Computer Interaction Institute, da Carnegie Mellon University, dos Estados Unidos, com 1,2 mil usuários do Facebook, aponta que o uso excessivo da rede social acentua a solidão. Especialistas alertam para o fato de que há uma diferença entre a palavra solidão e estar sozinho. Estar sozinho é uma escolha e a pessoa sente prazer nisso. Já a palavra solidão expressa algo mais profundo, o estado de quem se acha ou se sente solitário. Já o psiquiatra Aderbal Vieira Jr., professor e pesquisador da Unifesp, nota que nem toda tristeza é depressão. “A depressão não é qualquer estado de angústia, e nem a internet é um transtorno etiológico que causa a depressão. Mas uma pessoa tímida que usa a internet pode ser depressiva”. Suicídios Segundo estatísticas da Organização Mundial de Saúde (OMS), o suicídio já é a segunda principal causa de morte em todo mundo para jovens de 15 a 29 anos (1,3 milhão morrem no mundo anualmente, vítimas de causas evitáveis ou tratáveis). No Brasil, o índice é de 6,9 casos para cada 100 mil habitantes, relativamente baixo, se comparado aos países que lideram o ranking - Índia, Zimbábue e Cazaquistão, com mais de 30 casos. O Brasil é o 12º na lista de países latino-americanos com mais mortes desse tipo. O número de mortes nessa faixa etária só perde para acidentes de trânsito (11,6%); já para os casos de suicídio a porcentagem é de 7,3%. De acordo com a OMS, 800 mil pessoas tentam se matar todos os anos – para cada morte há pelo menos outras 20 tentativas fracassadas. A chefe da disciplina Medicina e Sociologia do Abuso de Drogas da Unifesp (Dimesad) Denise De Micheli afirma que não há uma relação linear entre o uso exacerbado de redes sociais com o aumento no número de suicídios (veja a entrevista, na página ao lado). Renato Cruz, jornalista e colunista do jornal O Estado de S. Paulo, diz ser difícil estabelecer uma relação de causa e efeito entre as tendências ao aumento do uso de redes sociais e os casos de depressão e de suicídio. “Uma não é correlação da outra. Tem que estudar a metodologia das duas causas”. Uma tese de mestrado, apresentada em 2014 por Fernanda Davidoff ao Programa de Pós-graduação em Educação e Saúde na Infância e na Adolescência da Unifesp, reportando uma pesquisa com 264 estudantes entre 13 e 17 anos, revela que 68% sofrem de dependência moderada em relação às tecnologias atuais (como smartphones, tablets e internet), enquanto que 20% são dependentes graves. “Possivelmente, estamos diante de uma geração que utiliza os meios tecnológicos como recurso principal para lidar, superficialmente, com seus problemas de relacionamento”, conclui Denise, orientadora da pesquisa. O amor on-line Erica Queiroz, consultora em relacionamentos, conheceu seu atual marido em uma rede social há 8 anos. A consultora escreveu um livro e mantém um blog para ajudar pessoas a encontrar sua alma gêmea. “As pessoas sempre têm que se precaver, coletar o máximo de informações que puderem sobre a pessoa em questão e passá-las para alguém, por segurança. Também marcar o primeiro encontro em um local público, cheio de gente”, ressalta. Outra usuária conheceu seu marido há quase 3 anos em um chat. A conversa passou para o Facebook e depois para o Skype, onde podiam se ver e se falar. “Acredito que nosso relacionamento deu certo porque nos aproximamos por interesses em comum e a química acabou ficando para um segundo momento”, conta. Hoje ela mora com o parceiro e eles têm um filho de dois anos. Apesar disso, reconhece que há uma certa tendência de pessoas com problemas de relacionamento usarem a internet como refúgio. A usuária recomenda desconfiar e usar a intuição, pesquisar muito sobre a pessoa antes de encontrá-la pessoalmente. Uma boa opção é utilizar ferramentas de vídeo para se comunicar. Assédio virtual cresce no Brasil No Brasil, onde é vertiginoso o crescimento do uso das redes sociais (veja o box, na página ao lado), há uma crescente apreensão, por parte de pais e responsáveis, sobre a exposição de crianças e adolescentes. Uma pesquisa feita por uma agência especializada, a TIC Kids Online Brasil, mostra que 35% deles se preocupam com o desempenho escolar, 23% com um eventual tratamento abusivo por outras crianças, 32% com a exposição a conteúdos inapropriados e 41% com a abordagem de estanhos. De janeiro a junho de 2014, 108 casos de exposição de imagens íntimas (prática criminosa chamada de sexting) foram registrados no país, segundo dados da ONG SaferNet (organização que trabalha no enfrentamento de crimes e violações aos direitos humanos na internet).No mesmo período, em 2013, houve39 ocorrências. O aumento não se deve necessariamente ao número de incidentes,e sim ao aumento das denúncias. A maioria das vítimas é composta de mulheres (77,14%), das quais 35,7% são adolescentes com idades entre 13 e 15 anos e 32,1% são jovens adultas de 18 a 25 anos. “A internet cria a possibilidade de alguém mandar uma foto, provocar o vazamento e gerar uma situação traumática. Possibilita a atitude inconsequente, mas não é causa”, alerta Aderbal Vieira Jr. A violência praticada contra alguém por meio da internet, uma conduta repetida, persistente e recorrente recebe a denominação de cyberbullying (assédio virtual). Uma pesquisa de 2014 da SaferNet aponta que 12% dos jovens entrevistados, com idade entre 18 e 23 anos, já sofreram bullying nas redes sociais, 35% já tiveram um amigo que sofreu e 49% têm medo que esse tipo de violência aconteça com eles. Uma mensagem disponibilizada de forma acidental não caracteriza cyberbullying. Segundo Raquel Lemos, professora e consultora jurídica, há também uma diferença dessa ação entre jovens e adultos. “Essa violência está muito vinculada a jovens e crianças. Já nos adultos se chama assédio moral”. Raquel observa, ainda, que o trauma provocado pelo ataque é agravado pela falta de ambiente para discuti-lo dentro de casa. “É importante ter diálogo, pois no ambiente doméstico ainda há muito constrangimento”, afirma. Em qualquer caso de cyberbullying é necessário recorrer a ajuda do Departamento Estadual de Investigações Criminais (DEIC).   Sumário do número 12
Roberto Leher, reitor da UFRJ, discorre sobre principais dificuldades enfrentadas pela maior universidade federal do país Da redação, Colaborou João Gabriel Roberto Leher, 54 anos, eleito em julho ao cargo de reitor da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), uma história de vida e militância marcada pela luta em defesa do ensino público, gratuito e democrático que, no ano 2000, o conduziria ao cargo de presidente do Sindicato Nacional dos Docentes das Instituições de Ensino Superior (Andes). Em entrevista ao Entrementes, o reitor Leher comenta o papel das greves no atual contexto nacional, fala sobre os desafios postos para as instituições públicas de ensino superior, suas consequências e os caminhos para enfrentar os problemas estruturais, sempre mantendo os princípios que escolheu defender ao longo de sua trajetória Entrementes: Como a atual conjuntura - especificamente o ajuste fiscal e as medidas do governo - afeta o projeto de educação pública no Brasil? Roberto Leher: A educação pública brasileira ainda não é uma educação universalizada, particularmente no ensino superior. Quando o ajuste fiscal incide sobre gastos sociais e, particularmente, gastos da educação, isso afeta de maneira estrutural a universidade. O ajuste fiscal traz restrições que podem levar à desarticulação de projetos de pesquisa importantes ou comprometer a participação dos estudantes em grupos de pesquisa por falta de infraestrutura: nós temos hoje um número grande de professores jovens nas universidades que não têm gabinete de trabalho.Tudo isso desorganiza a universidade, podendo acarretar prejuízos estruturais para o futuro do ensino, da pesquisa e da extensão no país. E: Se chegou a falar em 50% de corte nas verbas da UFRJ. Esse dado é correto? Quanto foi cortado para este ano? RL: Na realidade nós tivemos um corte de 50% de recursos de investimento e 10% de recursos de custeio. Mas esses cortes devem ser agregados aos cortes de 2014 que em geral não são muito mencionados. A UFRJ teve R$ 70 milhões contingenciados, inclusive recursos próprios, no ano passado, que fizeram com que o orçamento deste ano fosse duramente restrito, por isso chegaremos ao final deste ano com um déficit muito grande. Estamos trabalhando junto ao Ministério da Educação (MEC) para buscar uma forma de equacionar esse enorme déficit que hoje a maior universidade federal do país possui. E: Como o corte afeta a universidade? Quais os setores serão mais afetados e quais serão priorizados? RL: Hoje o investimento que temos que fazer em infraestrutura afeta muito diretamente a pesquisa, pois interfere na tecnologia. Os alojamentos estudantis e restaurantes universitários são insuficientes, considerando que a UFRJ traz estudantes do país inteiro – um quarto dos nossos estudantes vem de fora do Rio de Janeiro – e isso significa que nós precisamos de uma política de assistência estudantil robusta, compatível com o tamanho da instituição. Hoje não temos infraestrutura suficiente para dar suporte a muitos grupos de pesquisa que apresentam projetos, que demandam novos investimentos. Isso trava os grupos de pesquisa e cria uma situação de incerteza em relação ao futuro. Temos, hoje, uma situação muito grave, e particularmente uma expectativa dos novos professores e técnicos na universidade para os quais nós, literalmente, não temos local de trabalho para todos. E: Vimos nos últimos anos uma política de privatização, terceirização e parcerias público-privadas na educação. Qual a consequência disso para a educação em geral e universitária especificamente? RL: Obviamente nos preocupa o fato de que a aposta para a expansão da educação superior tenha como pressuposto que, no Brasil, ela vai ser assegurada pela ampliação da rede privada mercantil. Entretanto, essas instituições privadas são majoritariamente parte de uma engrenagem vinculada a fundos de investimento, os private equity, que são espaços de investimento de fundos de pensão de vários países, que têm como objetivo central o próprio fundo e não as instituições de ensino. Isso reconfigura de maneira radical a natureza dessas instituições privadas. Enquanto no período de 2007 a 2014 os recursos de investimento das federais foram de cerca de R$ 9 bilhões, somente em 2014 o FIES demandou R$ 13,5 bilhões do orçamento federal. Isso mostra uma prioridade muito problemática e que, ao nosso ver, tem que ser revista, pois o correto é a expansão do ensino público, pois é este que melhor responde às demandas da sociedade brasileira, da juventude, e sobretudo às demandas que a sociedade busca na universidade: uma capacidade crítica de produção de conhecimento novo e de buscar outra forma de solução dos grandes problemas que atingem os povos. E: Agora na posição de reitor, como lidar com as greves da comunidade acadêmica em crítica a uma política que não está propriamente nas mãos do reitor, mas com a qual ele tem que lidar? RL: A relação tem sido muito dialógica e estreita no que diz respeito à preocupação com o comum. Quando os estudantes entram em greve demandando mudanças na política de assistência estudantil; os professores, melhorias na carreira; e os técnicos administrativos, o aperfeiçoamento de carreira, da organização do trabalho, ou por serem contra os cortes orçamentários, as relações são vistas, por parte da Diretoria, como um processo de apreço à universidade; entendemos como pautas construtivas, somos solidários a ela. A Reitoria tem sua própria institucionalidade, os movimentos têm sua própria forma de auto-organização. Deve haver uma separação nítida e precisa do movimento - que deve ser sempre autônomo – e da Reitoria, mas compreendendo que essas lutas fazem parte de um processo que produz uma convergência no sentido de que todos estamos preocupados com o futuro da universidade pública. E: Diante desse quadro que vimos, como enfrentar esses problemas estruturais partindo do conceito de educação pública pelo qual você sempre lutou? RL: Eu creio que devemos retomar a reflexão que Florestan Fernandes fez, ao final dos anos 1980, na qual destacou que o futuro da educação pública dependeria necessariamente de um amplo protagonismo social. Os setores dominantes do Brasil têm uma visão instrumental e restrita da educação, basicamente pensada como capital humano e um capital humano para um capitalismo dependente. Ou seja, para inserção da juventude em forma de trabalho simples. Daí a ideia de que é possível formar de maneira minimalista a população. A contratendência a esse processo depende de amplo engajamento de movimentos sociais, entidades acadêmicas, movimentos sindicais, setores que estão comprometidos historicamente com a questão da educação pública, de modo que seja possível ampliar o protagonismo social e pressionar para que a educação ocupe outro lugar nas prioridades do Estado brasileiro. Esse é o grande horizonte, a formulação de Florestan com a qual estou de total acordo.     Sumário do número 12