Lentamente, chega o fim da tarde no emissário submarino de Santos (SP). Conforme o sol se põe, um grupo começa a se formar, aos poucos, perto da orla da praia. Desde 2010, essa é a rotina do programa Quiosque da Saúde, que realiza, três vezes por semana, atividades gratuitas, voltadas para adultos e idosos com hipertensão e diabetes. As sessões de exercícios físicos, com duração de uma hora, têm a supervisão de docentes e alunos do curso de Educação Física do Instituto de Saúde e Sociedade (ISS/Unifesp) - Campus Baixada Santista.
O programa propicia aos participantes um conjunto de ações que favorece a incorporação de um estilo de vida fisicamente ativo e que contribui para o controle da pressão arterial e da glicemia. É desenvolvido em parceria com a Secretaria Municipal de Esportes da Prefeitura de Santos, que cede um espaço para a guarda dos materiais utilizados nas atividades.
Durante esses encontros, são realizados exercícios aeróbios, que estimulam o sistema cardiovascular, e exercícios resistidos, que utilizam halteres, elásticos e o próprio peso do corpo. A glicemia e pressão arterial são mensuradas periodicamente como forma de orientar as estratégias de intervenção. Além disso, são efetuadas avaliações antropométricas, juntamente com testes de flexibilidade, de força e de resistência muscular.
“Apesar de ser um trabalho direcionado a diabéticos e hipertensos, o Quiosque da Saúde também aceita pessoas com fatores de risco ou com histórico de doenças na família. Dessa forma, acaba funcionando como ação preventiva”, explica o professor Ricardo José Gomes, que desde 2011 coordena o programa, implantado pelo professor Sionaldo Eduardo Ferreira, hoje na Universidade Federal do Triângulo Mineiro (UFTM).
Beneficiários
Até o momento, foram atendidas pelo Quiosque da Saúde aproximadamente 500 pessoas. Os candidatos que desejam ingressar no programa – que oferece um número restrito de vagas – devem efetuar a inscrição no início de cada ano. O fluxo de interessados é contínuo, mas há aqueles que permanecem no grupo por vários anos. Uma das frequentadoras mais antigas é Lucila Mendes Gonçalves, 63 anos, moradora de Santos, que acompanha as sessões desde 2011.
Hipertensa, ela explica que as atividades propostas ajudam a controlar a pressão alta e faz elogios à iniciativa. “O trabalho realizado aqui é excelente”, atesta. “Pretendo continuar enquanto esse serviço for oferecido ou até quando eu não puder mais vir.” Relata, ainda, que o programa cumpre outra função: “Além de nos exercitarmos, fazemos novas amizades, que são mantidas mesmo fora daqui”.
Novata no grupo deste ano, Isabel Bezerra Salgado, 66 anos, também hipertensa, descobriu o trabalho pela internet. Moradora do bairro do Boqueirão, em Santos, ela já foi auxiliar de enfermagem do Hospital São Paulo, que é o hospital universitário da Unifesp, e se diz apaixonada pela instituição. “Quando surgiu a oportunidade, não pensei duas vezes”, comenta rindo.
Por conta de um atropelamento, Isabel realizou cirurgia nos tendões do manguito rotador, localizados no ombro. Passou por sessões de fisioterapia e, com os exercícios adicionais, já sentiu os efeitos positivos. “Como profissional da saúde, eu me preocupo em cuidar de mim mesma. Enquanto houver esse trabalho, eu virei”, afirma.
(Fotografia: Alex Reipert)
Aprendizagem na prática
Atualmente, o professor Gomes conta com o apoio de dois estudantes do curso de Educação Física, que atuam como extensionistas do programa. Um deles é Renan Santos Silva Oliveira, que ingressou na Unifesp em 2017. Para ele, o Quiosque da Saúde acrescenta outros atributos à sua formação, pois proporciona o aprendizado dos métodos de trabalho que serão aplicados ao término da graduação.
“É um estágio antes do próprio estágio, válido para ganhar experiência e conhecer nosso público-alvo, que é a maior parte da população, uma vez que a parcela de atletas de alto rendimento é mínima. No caso de Santos, por exemplo, a cidade tem uma significativa proporção de idosos. A extensão favorece o aprendizado de nossa função na prática”, esclarece.
O outro extensionista é Lelis Conte Genaro, colega de turma de Renan. Para ele, as atividades de extensão contribuem para que o aluno vivencie como é ser professor na prática. “Aprendemos a planejar melhor as aulas, como devemos nos comunicar, como passar os exercícios. Isso é muito importante e será um diferencial no futuro”, justifica.
Efeitos comprovados
O efeito positivo dos protocolos de exercícios físicos sobre a saúde dos participantes já foi comprovado por dois estudos publicados nos últimos anos. “Um deles avaliou a pressão arterial de mulheres com hipertensão, além de parâmetros antropométricos e funcionais, demonstrando uma melhora em relação à primeira variável. O outro estudo também encontrou benefícios para as mulheres com diabetes tipo 2, principalmente em relação à glicemia e à aptidão funcional geral”, resume o coordenador.
No artigo publicado pela Revista Brasileira de Ciência e Movimento, em 2017, foram avaliados os efeitos do treinamento combinado moderado (aeróbio e resistido), durante seis meses, sobre a pressão arterial de repouso, variáveis bioquímicas (como glicose sanguínea e colesterol) e antropométricas (índice de massa corporal e perímetro de cintura) e aptidão funcional de dez mulheres hipertensas, frequentadoras do programa. Como conclusão, o trabalho confirmou que os exercícios físicos diminuíram os níveis de pressão arterial de repouso nessas mulheres e sugeriu melhora em variáveis antropométricas, bioquímicas e funcionais relacionadas à saúde.
Já a outra pesquisa, que foi publicada pela RBM - Revista Brasileira de Medicina, em 2015, investigou os efeitos do treinamento físico sobre diversos parâmetros em 16 mulheres com diabetes tipo 2. As sessões consistiram em exercícios aeróbios seguidos de exercícios resistidos (treinamento combinado moderado). A coleta de dados foi baseada nos parâmetros funcionais (testes de aptidão funcional), bioquímicos (glicemia, colesterol e triglicérides), antropométricos (estatura, massa corporal, índice de massa corporal e circunferência abdominal) e hemodinâmicos (pressão arterial).
O treinamento foi eficiente ao promover alterações importantes em parâmetros relacionados à saúde de mulheres com diabetes tipo 2. Os dados demonstraram que houve melhora significativa na resistência de força, coordenação, índice de aptidão física geral, glicemia de jejum e pressão arterial de repouso.
Atual coordenador do programa, Ricardo José Gomes (centro), e os extensionistas Lelis Conte Genaro (à esquerda) e Renan Santos Silva Oliveira (à direita) / Fotografia: Alex Reipert
Novata no grupo, Isabel Bezerra Salgado já sente os efeitos positivos dos exercícios / Fotografia: Alex Reipert
Projetos parceiros
No sentido de viabilizar intervenções multiprofissionais e interdisciplinares, o Quiosque da Saúde recorre, ainda, a parcerias. A principal delas foi firmada com o Grupo de Estudos da Obesidade (GEO), sob a responsabilidade da professora Danielle Arisa Caranti. Com o apoio do GEO, os integrantes do programa podem exercitar-se em bicicletas ergométricas e esteiras, sendo também avaliados. “Além de uma boa estrutura, o GEO oferece atendimento com psicólogos, nutricionistas e fisioterapeutas”, relata Gomes.
Outro exemplo de ação conjunta provém do Projeto de Capacitação para Prevenção de Acidentes e Primeiros Socorros, coordenado pela professora Alessandra Medeiros, que realizou oficinas sobre ressuscitação cardiopulmonar e primeiros socorros. “É importante saber como se comportar nessas situações, já que são idosos que convivem com outros idosos”, avalia o docente.
Cabe também mencionar os projetos de extensão Clube da Corrida e Clube do Pedal, vinculados ao Programa de Educação Tutorial do curso de Educação Física (PET-EF) e coordenados pelo professor Ricardo Guerra, os quais possibilitam o desenvolvimento de atividades complementares voltadas à prática esportiva.
Dessa forma, além dos exercícios físicos para o controle de doenças crônicas, o programa Quiosque da Saúde oferece aos voluntários palestras sobre educação em saúde, que estimulam a mudança de hábitos e contribuem para a melhoria da qualidade de vida.
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Edição 12 • novembro 2019