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Nova técnica ajuda a compreender as doenças cerebrais

Uso de tinta nanquim e gelatina proporciona imagem tridimensional e em alta resolução dos vasos sanguíneos

Imagem mostra rede de vazos do cerebelo

Gerar imagens de alta resolução em 3D, por meio de um método simples, barato e acessível a grande parte dos laboratórios no mundo, que possibilite examinar e quantificar os vasos sanguíneos do cérebro. Foi com esse objetivo que pesquisadores da Escola Paulista de Medicina (EPM/Unifesp) – Campus São Paulo e da Universidade de Surrey, no Reino Unido, desenvolveram uma técnica inovadora cujos resultados foram publicados no Journal of Anatomy.

“Essa nova técnica de dissolver tinta nanquim (China ink) em gelatina, injetar a mistura nos vasos cerebrais e, em seguida, mergulhar o cérebro em soluções que o tornem transparente tem a vantagem de proporcionar alta resolução de imagem, ser facilmente executada e utilizar materiais acessíveis e de baixo custo. O processo de preparação do material também é bastante rápido, levando cerca de 24 horas”, explica o pesquisador responsável Robson Campos Gutierre, que realiza o pós-doutorado no Departamento de Neurologia e Neurocirurgia, sob a orientação de Ricardo Arida, docente do Departamento de Fisiologia.

O trabalho possibilitará que cientistas examinem a circulação sanguínea no cérebro, compreendam com maior clareza como ela funciona e investiguem como doenças cerebrais – demência, câncer, epilepsia e derrame, por exemplo – podem afetar o sistema vascular desse órgão. Atualmente, as técnicas para obtenção de imagens de vasos sanguíneos em cérebros tornados transparentes são de difícil execução e dependem do uso de anticorpos e proteínas fluorescentes, que têm alto custo.

Apesar de os experimentos terem sido realizados com animais eutanasiados após anestesia, os dados obtidos poderiam ser potencialmente aplicados em seres humanos, auxiliando no desenvolvimento de terapias para doenças neurodegenerativas e de medicamentos para tumores, o que reduziria o número de mortes decorrentes de várias patologias cerebrais. "Outra vantagem é a possibilidade de obter imagens de estruturas cerebrais ao microscópio, sem prévios cortes em equipamentos mecânicos, pois os cortes são ópticos, digitalizados, e um programa de computador encarrega-se de montar a imagem em 3D ", relata Gutierre, que já estuda patentear uma nova lâmina histológica que desenvolveu para a técnica em questão.

Com o uso de um microscópio confocal a laser, que “varre” as amostras em diferentes planos e monta uma imagem em 3D, essa técnica torna os vasos sanguíneos visíveis, permitindo aos cientistas e patologistas realizarem – com o auxílio de um software – a leitura precisa de seu número, comprimento e área de superfície. Além disso, possibilita a utilização das imagens tridimensionais, que podem ajudar a identificar mudanças quantitativas, consideradas indicadores-chave de uma série de doenças relacionadas à circulação sanguínea no cérebro.

Outras finalidades

O procedimento também poderá ser aplicado em biópsias de tecidos animal e humano e em exames post-mortem, facilitando aos patologistas a determinação das causas de morte e a identificação rápida de alterações na circulação cerebral, tais como a formação de coágulos ou tumores.

Além disso, esse método inovador poderá trazer maior compreensão sobre como o exercício físico afeta o cérebro. Haverá a possibilidade de os cientistas analisarem – no campo cerebral – os efeitos circulatórios decorrentes do aumento ou diminuição da frequência cardíaca, a pressão arterial e a criação de novos vasos, a chamada angiogênese. Este último processo desempenha, inclusive, um importante papel sob determinadas condições fisiológicas e patológicas de nosso organismo, tornando essenciais novos métodos de visualização da microvasculatura.

Coautor do estudo, Augusto Coppi, médico veterinário, anatomista veterinário e especialista em estereologia da Escola de Medicina Veterinária da Universidade de Surrey, explica que ainda há uma lacuna na compreensão humana sobre a circulação sanguínea no cérebro, que é um órgão fascinante.

“Anteriormente, fomos incapazes de fazer uma amostragem completa e realizar a quantificação acurada dos vasos sanguíneos do cérebro em 3D, pois simplesmente não conseguíamos ver todos os vasos devido a seu tamanho minúsculo e, às vezes, devido à sua distribuição espacial irregular”, observa.

Juntamente com Gutierre, Arida e Coppi, assinam ainda o estudo Renato Mortara, professor titular da disciplina de Parasitologia, do Departamento de Microbiologia, Imunobiologia e Parasitologia, e Diego Vannucci Campos, doutor em Neurociências pela Unifesp.


Artigo relacionado:

GUTIERRE, R. C.; CAMPOS, D. Vannucci; MORTARA, R. A.; COPPI, A. A.; ARIDA, R. M. Reflection imaging of China ink-perfused brain vasculature using confocal laser-scanning microscopy after clarification of brain tissue by the Spalteholz method. Journal of Anatomy, [s. l.], v. 230, n. 4, p. 601-606, 5 jan. 2017. Disponível em: <http://onlinelibrary.wiley.com/doi/10.1111/joa.12578/full >. Acesso em: 16 mar. 2017.