As doenças cardiovasculares – todo e qualquer agravo que dificulte ou impeça a boa circulação sanguínea no organismo – ainda são a maior causa de morte em todo o mundo. Dados da Organização Mundial da Saúde (OMS) apontam que, anualmente, cerca de 17,5 milhões de pessoas perdem suas vidas em decorrência delas. No Brasil, esse número ultrapassa 350 mil – duas vezes maior que todas as mortes por câncer e seis vezes que as decorrentes de infecções –, correspondendo a 30% dos óbitos registrados. São cerca de mil óbitos por dia, 43 por hora e um a cada 90 segundos, de acordo com a Sociedade Brasileira de Cardiologia.
Para corrigir problemas e doenças no coração muitas vezes é necessário algum procedimento cirúrgico e o risco de complicações, como o sangramento excessivo – que acomete entre 6,4% a 52,9% dos casos em adultos – pode ocorrer. Nesses casos, pode haver necessidade de transfusão de hemoderivados ou hemocomponentes e outros procedimentos de emergência, além de ocorrer aumento do risco do surgimento de outras complicações, como diferentes tipos de infecções, arritmias e problemas nos rins.
De acordo com Camila Takáo Lopes, autora de um estudo que avaliou a incidência de sangramento excessivo e preditores nas primeiras 24 horas após a cirurgia cardíaca, é preciso reconhecer precocemente ou prevenir a ocorrência das complicações, considerando-se não apenas o alto custo do tratamento, mas também a gravidade das implicações pós-cirúrgicas.
Para a análise desses fatores, a enfermeira, que defendeu esse trabalho como sua tese de doutorado, em 2014, no Programa de Pós-graduação em Enfermagem da Escola Paulista de Enfermagem (EPE/Unifesp) - Campus São Paulo, fez uma revisão da literatura, levantando os potenciais fatores de risco para sangramento excessivo, e acompanhou 323 pacientes adultos de um hospital de referência em Cardiologia na cidade de São Paulo, submetidos a cirurgias cardíacas em que o tórax é aberto.
Os fatores de risco encontrados na revisão de literatura foram investigados antes, durante e após a cirurgia. A enfermeira acompanhou as ocorrências de sangramento excessivo, a necessidade de transfusão de hemácias ou de nova cirurgia de emergência ao longo de 24 horas após a admissão na unidade de terapia intensiva (UTI) pós-operatória. trabalho foi orientado por Alba Lucia Bottura Leite de Barros e Juliana de Lima Lopes, docentes da EPE/Unifesp.
“Um impacto significante do nosso estudo foi a adoção da nossa revisão de literatura pela Sociedade Europeia de Anestesiologia, para indicar o que deve ser avaliado no pré-operatório de cirurgia cardíaca quanto ao risco de sangramento, em suas diretrizes para o manejo de sangramento grave perioperatório”, explica Lopes, que atualmente é professora do Departamento de Enfermagem Clínica e Cirúrgica da EPE/Unifesp.
O trabalho também ganhou três prêmios: Prêmio Capes de Tese 2016 na Área de Enfermagem, primeiro lugar no Departamento de Enfermagem, na modalidade de apresentação oral, em 2015, durante o XXXVI Congresso da Sociedade de Cardiologia do Estado de São Paulo e o Prêmio Mariana Fernandes de Souza, como melhor trabalho apresentado no Evento Doutorado em Enfermagem da Unifesp: Contribuições para a Ciência e a Arte, em 2016.
Variáveis para complicações na cirurgia cardíaca
Sangramento excessivo
• sexo masculino
• menor índice de massa
• corpórea (IMC < 26,34)
• menor contagem de plaquetas (< 214.000/mm³)
• volume de heparina (> 6,25 mL)
Transfusão de hemácias
• peso inferior a 66,5 kg
Reabordagem cirúrgica de emergência
• transfusão pós-operatória de hemocomponente
Diferentes preditores
Dos 323 pacientes, 105 (32,5%) apresentaram sangramento excessivo. As variáveis do pré-operatório associadas ao sangramento incluíram: sexo masculino, menor índice de massa corpórea (IMC <26,34), menor contagem de plaquetas (< 214.000/mm³) no sangue e volume de heparina (> 6,25 mL). A heparina é uma substância anticoagulante que precisa ser utilizada durante a cirurgia. Vinte pacientes (6,20%) precisaram receber transfusão de concentrado de hemácias (hemocomponente). O preditor independente para esse procedimento foi o peso menor que 66,5 kg. Dezoito pacientes (5,60%) foram submetidos à reabordagem cirúrgica de emergência. O preditor, nesses casos, foi a transfusão pós-operatória de hemocomponentes.
Tese relacionada:
LOPES, Camila Takáo. Incidência de sangramento excessivo e preditores no pós- operatório imediato de cirurgia cardiaca. 2015. 136f. Tese (Doutorado em Ciências) – Escola Paulista de Enfermagem, Universidade Federal de São Paulo, São Paulo.
Artigos relacionados:
LOPES, Camila Takao; SANTOS, Talita Raquel dos; BRUNORI, Evelise Helena Fadini Reis; MOORHEAD, Sue Ann; LOPES, Juliana de Lima; BARROS, Alba Lucia Bottura Leite de. Excessive bleeding predictors after cardiac surgery in adults: integrative review. Journal of Clinical Nursing, v. 24, p. 3.046-3.062, nov. 2015. Disponível em: <https://doi.org/10.1111/jocn.12936 >. Acesso em: 1 mar. 2019.
LOPES, Camila Takao; BRUNORI, Evelise Helena Fadini Reis; CAVALCANTE, Agueda Maria Ruiz Zimmer; MOORHEAD, Sue Ann; SWANSON, Elizabeth; LOPES, Juliana de Lima; BARROS, Alba Lucia Bottura Leite de. Factors associated with excessive bleeding after cardiac surgery: a prospective cohort study. Heart & Lung, v. 45, n. 1, p. 64-69, jan. – fev. 2016. Disponível em: <https://doi.org/10.1016/j.hrtlng.2015.09.003 >. Acesso em: 1 mar. 2019.
LOPES, Camila Takao; BRUNORI, Evelise Helena Fadini Reis; SANTOS, Vinicius Batista; MOORHEAD, Sue Ann; LOPES, Juliana de Lima; BARROS, Alba Lucia Bottura Leite de. Predictive factors for bleeding-related re-exploration after cardiac surgery: a prospective cohort study. European Journal of Cardiovascular Nursing, v. 15, n. 3, p. 70-77, 17 abr. 2015. Disponível em: <https://doi.org/10.1177/1474515115583407 >. Acesso em: 1 mar. 2019.
Camila Takáo Lopes, Alba Lucia Bottura Leite de Barros e Juliana de Lima Lopes / Imagem: Alex Reipert/DCI-Unifesp
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Edição 11 • junho 2019