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Estudo brasileiro revela desafios e mapeia necessidades de cuidadores de pessoas com demência

Pesquisa da Unifesp destaca sobrecarga emocional, falta de preparo e carência de apoio enfrentadas por cuidadores(as) não profissionais no país

Um estudo liderado por pesquisadores(as) da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp) traz à tona os grandes desafios enfrentados por cuidadores(as) familiares de pessoas com demência. A pesquisa, publicada na renomada revista Alzheimer’s & Dementia: Translational Research & Clinical Interventions, é uma das mais amplas sobre a vida e necessidades dos(as) cuidadores(as) no Brasil, destacando as carências no preparo, a sobrecarga emocional e as necessidades não atendidas desses cuidadores, que em sua maioria são mulheres de meia-idade e desempenham o papel sem suporte financeiro.

Principais achados do estudo

Perfil dos(as) cuidadores(as): a pesquisa mostra um retrato majoritariamente feminino: 93,6% das pessoas que cuidam são mulheres, com idade média de 48,8 anos. Quase todas (94,9%) realizam o trabalho sem qualquer remuneração e 42,8% tiveram de abandonar o emprego para dedicar-se integralmente ao familiar com demência.

Sobrecarga física e emocional: o preço dessa dedicação é alto: 85% relatam exaustão emocional e 78% cansaço físico constante. Ainda assim, 44% dizem sentir-se, de alguma forma, recompensadas pelo papel – uma combinação de desgaste e propósito que evidencia a urgência de políticas de apoio.

O que os números mostram:

  • Trabalho solitário: 87% dos(as) cuidadores(as) afirmaram precisar de mais ajuda de outras pessoas;
  • Mulheres estão no centro: a feminização do cuidado persiste – praticamente 9 em cada 10 cuidadores são filhas, esposas ou noras na faixa dos 50 anos;
  • Tarefa tem enormes desafios: 62,5% relataram que o cuidado impactou negativamente sua vida pessoal;
  • Falta de rede formal: na ausência de serviços públicos robustos, 1 em cada 3 cuidadores afirma não ter ninguém para dividir tarefas durante a semana;
  • Falta de preparo: 46% dos(as) cuidadores(as) sentem-se despreparados(as) para a função, e 39% possuem uma autopercepção negativa do próprio papel;
  • Trabalho invisível: quase metade abandona o emprego para cuidar, sem compensação financeira ou garantia de direitos trabalhistas;
  • Renda: ter apoio financeiro (36,3%) e compartilhamento das responsabilidades (33,1%) foram apontados como as soluções mais urgentes para melhorar o seu bem-estar;
  • Apoio emocional: 62% expressaram a necessidade de suporte emocional como uma das principais carências em sua rotina de cuidado.

Contexto e impacto

A demência é um desafio crescente no Brasil, com aproximadamente 1,7 milhão de pessoas acima de 60 anos vivendo com a condição. O estudo revela que os(as) cuidadores(as) familiares, muitas vezes sem apoio formal, enfrentam dificuldades como falta de tempo, escassez de informações sobre a doença e pressões financeiras. Palavras como "ajuda", "orientação" e "falta de tempo" foram frequentes em respostas abertas, destacando a necessidade de políticas públicas direcionadas.

Considerando o número de pessoas vivendo com demência e que cada pessoa cuidada necessita ao menos de uma pessoa para cuidar, estima-se que há quase 2 milhões de cuidadores dessas pessoas de idade convivendo com demência no Brasil, que enfrentam diariamente sobrecarga física e emocional, devido às condições de trabalho, contexto social e entendimento da complexidade da doença da pessoa cuidada.

Recomendações

Os(As) pesquisadores(as) enfatizam a urgência de:

  • Programas de educação: capacitar cuidadores(as) com informações sobre demência e técnicas de cuidado;
  • Apoio financeiro: implementar políticas públicas que aliviem a carga econômica, como benefícios sociais;
  • Redes de suporte: criar estruturas públicas para compartilhar responsabilidades e oferecer suporte emocional;
  • Políticas públicas: fortalecer as leis que garantem cuidado e atenção às demências e que ainda não têm implementação adequada.

Sobre o estudo

Realizado entre fevereiro de 2022 e janeiro de 2023, o estudo coletou dados de 381 participantes (taxa de resposta de 53% entre 711 potenciais convidados), dos quais 311 (82%) se identificaram como cuidadores(as) não profissionais, por meio de questionários digitais e entrevistas. A pesquisa contou com a colaboração de especialistas em saúde, tecnologia e ciências sociais, garantindo uma abordagem interdisciplinar.

O que dizem os autores

"Os resultados mostram que os cuidadores brasileiros enfrentam desafios similares aos de outros países, mas com particularidades locais, como a falta de suporte estruturado. Os dados apontam que é essencial desenvolver intervenções culturalmente adaptadas e implementar políticas públicas no SUS para melhorar sua qualidade de vida. Isso é o que vemos nos serviços de saúde, mas não tínhamos tantos detalhes", afirma o médico neurologista Alan Cronemberger Andrade, autor principal do estudo e professor na UFBA.

Já Walter Lima, docente do Instituto de Ciência e Tecnologia (ICT/Unifesp) - Campus São José dos Campos, destaca a importância do caráter interdisciplinar do estudo. Pesquisador do Grupo de Sistemas Cognitivos Artificiais e líder da pesquisa (ICT/Unifesp), aponta como o trabalho contou com a colaboração de especialistas de diferentes áreas: Medicina (Neurologia), Terapia Ocupacional e Tecnologias Assistivas (Unifesp), além de Ciência da Computação (UFABC). Segundo ele, essa diversidade de conhecimento foi fundamental para construir uma visão mais ampla e inovadora sobre o tema.

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