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Microrregulação do acesso aos serviços das UBSs ainda é um desafio

Estudo aponta limites de unidade básica de saúde paulista para gerir os casos que não são considerados urgentes

Foto de uma recepção de serviço de saúde, a imagem mostra as pessoas da cintura para baixo, elas estão esperando, sentadas ou em pé

Agilidade para resolver casos emergenciais de saúde e dificuldade para gerir os menos urgentes. Essa foi a conclusão da dissertação de mestrado elaborada por Lissandra Andion de Oliveira, aluna do programa de pós-graduação em Saúde Coletiva do Departamento de Medicina Preventiva da Escola Paulista de Medicina (EPM/Unifesp) – Campus São Paulo. 

O tema da dissertação, intitulada Processos Microrregulatórios em uma Unidade Básica de Saúde e a Produção do Cuidado, faz parte da linha de pesquisa A Gestão do Cuidado e o Trabalho e(m) Saúde, que há 10 anos aborda o Sistema Único de Saúde (SUS). O estudo integra uma investigação maior, denominada Atenção Primária à Saúde como Estratégia para Reconfiguração das Políticas Nacionais de Saúde: a Perspectiva de seus Profissionais e Usuários, que abrange o período de 2013-2016 e é financiada com recursos do programa de Políticas Públicas para o SUS (PPSUS) – Fapesp e do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq). 

O trabalho consistiu no acompanhamento da rotina de uma unidade básica de saúde da região metropolitana de São Paulo, por cerca de oito horas semanais, durante o período de 10 meses. Nesse espaço de tempo, a pesquisadora observou todos os processos microrregulatórios realizados no local, desde os administrativos até os clínicos, utilizando-se do método etnográfico desenvolvido por meio de três técnicas: análise documental, observação participante e entrevistas semiestruturadas.

Entende-se como processo microrregulatório a formulação e operacionalização de regras e/ou normas locais pelos profissionais no seu encontro com o usuário – na recepção, no acolhimento, na farmácia e nos consultórios (itens da microrregulação interna) –, ou ainda no contato da unidade básica com os demais serviços ou instâncias da secretaria municipal (microrregulação externa) para oferecer o atendimento mais adequado, e em tempo oportuno, aos usuários sob a responsabilidade dessa UBS, mediante o acompanhamento dos fluxos e normas regulatórias instituídas pela gestão municipal.

O orientador do trabalho e docente do Departamento de Medicina Preventiva, Luiz Carlos de Oliveira Cecílio, explicou que boa parte do material utilizado teve caráter empírico e resultou do registro das cenas observadas pela mestranda durante o período em que permaneceu na unidade. Nas palavras do orientador, “o estudo de Lissandra procurou compreender quanto a equipe da UBS consegue fazer ou não a microrregulação”.

Mais atenção aos casos menos graves

Foto da pesquisadora ao lado de seu orientador, eles estão em frente a um brasão da EPM

A pesquisadora Lissandra Andion de Oliveira com seu orientador, Luiz Carlos de Oliveira Cecílio

Além dos fatos observados, Lissandra entrevistou seis integrantes da equipe da UBS envolvidos no processo microrregulatório: três médicas especialistas, um médico generalista, uma oficial administrativa e a gerente da unidade. De forma complementar, foi realizada análise documental da descrição das características do município e do histórico de implantação da regulação assistencial.

Inicialmente, o objetivo do estudo era verificar como a unidade fazia a articulação para “fora”, isto é, buscava-se compreender melhor o grau de autonomia da equipe para conseguir o acesso de seus usuários aos demais serviços que compõem a rede de saúde. No entanto, as entrevistas e a observação participante possibilitaram pensar a microrregulação do acesso com mais complexidade ao contemplar duas dimensões complementares do processo: a interna e a externa.

Por meio da observação, foi possível identificar que as ocorrências mais graves, chamadas de prioridade zero, recebiam atenção máxima dos principais agentes envolvidos na microrregulação – médico, oficial e gerente – e eram encaminhadas da forma correta e com a agilidade requerida. “O critério é clínico. Quando há risco de vida e o médico que comanda a equipe identifica esse risco, o caso torna-se prioridade zero; a unidade funciona bem com a microrregulação”, diz Cecílio. No entanto, os casos de menor gravidade não recebiam indicação de prioridade por parte do médico da equipe, que não conhecia os fluxos instituídos para as demais situações. Cabia, assim, à oficial definir se acionaria a central de regulação municipal ou diretamente o serviço especializado de referência onde a vaga seria disponibilizada, ou ainda recorrer ao próprio médico da unidade básica. Em tais situações, a classificação ocorria por ordem de chegada. “Não se trata de não prestar atendimento; os pacientes são atendidos, mas dentro do padrão”, observa Lissandra.

O estudo, no entanto, não buscou interferir na conduta dos profissionais da UBS. “Nosso objetivo não era entrar para modificar ou aprimorar o que eles faziam. Pelo contrário, desejávamos entender a forma como eles atuavam na prática”, complementa.

Por fim, a pesquisadora sugeriu que os casos menos graves fossem discutidos um a um, a fim de que recebessem melhor encaminhamento. “As unidades de atenção básica têm reunião de equipe, reunião da unidade como um todo e reunião com o pessoal externo à UBS. São espaços para uma constante reavaliação das fichas que são simplesmente acumuladas, sem que se consiga discriminar e priorizar situações de maior vulnerabilidade, que podem escapar quando classificadas apenas por ordem de chegada”, finaliza.

Artigos relacionados: 

ALBIERI, Flavius Augusto Olivetti; CECÍLIO, Luiz Carlos de Oliveira. De frente com os médicos: uma estratégia comunicativa de gestão para qualificar a regulação do acesso ambulatorial. Saúde em Debate, Rio de Janeiro, v. 39, n. especial, p. 184-195, dez. 2015. Disponível em: < http://www.scielo.br/scielo.php?pid=S0103-11042015000500184&script=sci_abstract >. Acesso em: 15 abr. 2016.

IBANHES, Lauro Cesar et al. Governança e regulação na saúde: desafios para a gestão na região metropolitana de São Paulo, Brasil. Cadernos de Saúde Pública, Rio de Janeiro, v. 23, n. 3, p. 575-584, mar. 2007. Disponível em: < http://www.bib.unesc.net/arquivos/70000/74900/11_74907.htm >. Acesso em: 15 abr. 2016.