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Onde tudo começou

Expedição Roncador-Xingu instala núcleos de povoamento, abre campos de pouso e chega às cabeceiras do Xingu; a experiência de contato com os povos do Alto Xingu inspira a criação do parque indígena

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Até a década de 1940 a ocupação das regiões Norte e Centro-Oeste – já habitadas por povos indígenas – constituía um desafio para o governo central. Mapear e colonizar essas regiões, reeditando a empreitada dos bandeirantes nos séculos XVII e XVIII, era um dos objetivos do Estado Novo (1937-1945), instaurado por Getúlio Vargas. O projeto de interiorização do desenvolvimento, que se denominou Marcha para o Oeste, pretendia criar novas vias de comunicação, abrir campos de pouso e fixar núcleos populacionais. Paralelamente, havia a motivação de preencher os vazios demográficos, que – segundo a doutrina do “espaço vital”, difundida pelo nazismo – poderiam servir aos países europeus para o assentamento de seus excedentes populacionais.

Gerenciada pela Fundação Brasil Central, a Expedição Roncador-Xingu representou a principal frente do projeto e seu objetivo – na etapa inicial – era alcançar a Serra do Roncador (Mato Grosso) e os formadores do rio Xingu. Em 1943, uma composição férrea com 19 vagões, que comportavam uma colossal carga, além do pessoal efetivo, transportou a expedição de São Paulo até Uberlândia (MG). O trecho seguinte, com 900 quilômetros, foi feito em caminhões e outros veículos de transporte, que se deslocaram por precárias estradas de terra até Aragarças, às margens do rio Araguaia. Nesse ponto, foi instalada a primeira base de operações, com edificações para os serviços e alojamentos. Feita a transposição do rio, a expedição avançou 150 quilômetros, desbravando trilhas com o auxílio de muares, até alcançar – em meados de 1945 – o rio das Mortes e as primeiras elevações da Serra do Roncador. Embora a Força Aérea Brasileira provesse os serviços de retaguarda, o grupo de expedicionários enfrentava condições difíceis devido ao suprimento irregular de víveres e medicamentos, à malária e à hostilidade dos índios Xavante. Em 1946, os irmãos Villas Bôas – que passaram a liderar a expedição – atingem as cabeceiras do rio Xingu e estabelecem contato amistoso com os povos indígenas, debilitados por epidemias e pela alta mortalidade infantil.

Em sua rota, a expedição abriu 1.500 quilômetros de trilhas, construiu 19 campos de pouso, instalou três bases operacionais e fixou mais de 40 núcleos de povoamento.

A criação do Parque Indígena do Xingu

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Orlando Villas Bôas – que nesta foto de 1965 medica o índio Mengrire, de origem Panará, criado pelo povo Kaiapó Metuktire – assumiu em 1945 a liderança da Expedição Roncador-Xingu, juntamente com seus irmãos, Cláudio e Leonardo

Convictos de que o índio só poderia sobreviver dentro da própria cultura, os irmãos Villas Bôas – apoiados por lideranças políticas e intelectuais como o antropólogo Darcy Ribeiro e o médico sanitarista Noel Nutels – mobilizaram-se para a criação de um parque indígena no Alto Xingu. A demarcação de uma reserva natural garantiria aos povos dessa região os meios de subsistência, o atendimento à saúde e a defesa contra as frentes de ocupação da sociedade. Em 1952 foi, então, apresentado ao Congresso um requerimento com esse teor, não obstante a oposição do governo de Mato Grosso, que promovia a concessão de glebas às empresas colonizadoras. Em 1961, no governo de Jânio Quadros, a proposta foi retomada, concretizando-se com a edição do Decreto n.º 50.455/61.

Somadas as terras indígenas de Wawi, Batovi e Pequizal de Naruvoto, o Parque Indígena do Xingu (PIX) perfaz atualmente 2,8 milhões de hectares e abriga nações que preservam as línguas tradicionais, vinculadas – na maior parte – às famílias jê, karib, aruak e tupi-guarani. Na porção sul (Alto Xingu) estão instaladas dez etnias que já habitavam esse território e mantêm padrões culturais similares. As seis restantes foram transferidas para áreas específicas do PIX por correrem risco de desaparecimento ou necessitarem de assistência material.

Em contraste com as extensas áreas de pastagens e plantações de soja que compõem seu entorno, o PIX exibe uma rica paisagem natural, formada pelas florestas de transição, constituindo um santuário da sociobiodiversidade.

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Traslado do povo Panará para o PIX (1975). O sertanista Cláudio Villas Bôas aparece de óculos escuros

Livros e artigos relacionados:
BARUZZI, Roberto G.; JUNQUEIRA, Carmen (Org.). Parque Indígena do Xingu: saúde, cultura e história. São Paulo: Terra Virgem, 2005.
COTA, Luiz Gustavo. Os irmãos Villas Boas e o Xingu. Planos de Aula. Nova Escola. Disponível em: <http://www.gentequeeduca.org.br/planos-de-aula/os-irmaos-villas-boas-e-o-xingu>. Acesso em: 16 jul. 2015.
INSTITUTO SOCIOAMBIENTAL. Almanaque Socioambiental: Parque Indígena do Xingu: 50 anos. São Paulo: Instituto Socioambiental, 2011.
MAIA, João Marcelo Ehlert. As ideias que fazem o Estado andar: imaginação espacial, pensamento brasileiro e território no Brasil Central. DADOS – Revista de Ciências Sociais, Rio de Janeiro, v. 53, n. 3, p. 621-655, 2010. Disponível em: <http://www.scielo.br/pdf/dados/v53n3/a04v53n3.pdf>. Acesso em: 23 jul. 2015.
POLÍTICA indigenista. Fundação Nacional do Índio – FUNAI. Disponível em: <http://www.funai.gov.br/index.php/nossas-acoes/politica-indigenista>. Acesso em: 17 jul. 2015.
RONDON: a construção do Brasil e a causa indígena. Coordenação geral de Elizabete Braga. Website desenvolvido por Daniel Kusaka. Conteúdo produzido para o Projeto Memória/ Fundação Banco do Brasil. Disponível em: < http://www.projetomemoria.art.br/rondon/vida-convite-a-uma-trilha.jsp>. Acesso em: 13 jul. 2015.
SILVA, Hiram Reis e. Expedição Roncador-Xingu II. Pantanal News, Aquidauana (MS), 22 ago. 2011. Disponível em: <http://www.pantanalnews.com.br/contents.php?CID=74815>. Acesso em: 14 jul. 2015.
VILLAS BÔAS, Orlando; VILLAS BÔAS, Cláudio. A marcha para o Oeste: a epopeia da Expedição Roncador-Xingu. São Paulo: Companhia das Letras, 2012.

Breve panorama sobre a política indigenista no Brasil

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Marco geodésico que determina o limite do PIX

Fundado em 1910, o Serviço de Proteção ao Índio (SPI) tinha a missão de prestar assistência aos índios, viabilizando a política indigenista. Outros objetivos do SPI mencionavam a integração ao trabalho agrícola e a transmissão de hábitos civilizados, o que interferia nas práticas tradicionais das etnias. Cândido Rondon, militar responsável pela construção de linhas telegráficas no interior do país, que estabelecera relações pacíficas com os grupos contatados, ocupou pela primeira vez a diretoria do órgão. Em 1916, o Código Civil reconhece os silvícolas como “relativamente incapazes”, razão pela qual deveriam submeter-se ao regime de tutela pelo Estado. Em 1967, o SPI é extinto, criando-se a Fundação Nacional do Índio (Funai). Seu papel era promover a integração dos indígenas à sociedade brasileira, os quais eram considerados não suficientemente “evoluídos”. O Estatuto do Índio, de 1973, define – entre outros pontos – novos parâmetros sobre a propriedade, defesa e ocupação de suas terras, representando um avanço na legislação vigente. Na década de 1980, no contexto dos movimentos sociais pela democracia, os povos indígenas apresentam outra proposta de política indigenista. A Constituição de 1988 altera o modelo político baseado na tutela e assistencialismo, reconhece o direito originário desses povos sobre as respectivas terras e assegura-lhes o respeito à cultura e formas de organização social. Em 2015 está prevista a realização da 1.ª Conferência Nacional de Política Indigenista no período de 17 a 20 de novembro.

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